Gustavo Hoffay – Agente Social- Uberlândia-MG

Durante três anos consecutivos viajei por todo o Brasil na condição de Supervisor de Vendas de uma grande empresa local do ramo de comércio por atacado e o que, confesso, serviu-me (também) para forrar a minha conta bancária para que, logo em seguida, eu assumisse um compromisso de casamento com aquela que, até hoje, passados quase trinta e seis anos, tem suportado esse cidadão belorizontino, criado em Diamantina e enquanto servindo-me da melhor paçoca de carne de todo o Vale do Jequitinhonha . Foi um tempo muito bom em termos de conhecimento geral: vilas, cidades, folclore, culinária e cultura típicos de cada uma das regiões visitadas, além de ouvir muitas estórias e “causos” à porta de hotéis, pensões e dormitórios diversos que serviam-me de breve abrigo. E numa dessas andanças, durante uma época de eleições municipais, tive a oportunidade de assistir propagandas políticas bem originais, peculiares mesmo, de candidatos aos cargos de prefeito e vereador e tomar conhecimento da imodéstia como o seu traço característico. No interior do Pará, Maranhão e Tocantins,por exemplo, dezenas e dezenas de faixas diziam que Fulano, Cicrano ou Beltrano era o “único e verdadeiro amigo do povo”, “o mais confiável”; “ o Homem é Fulano “, “Cicrano é o candidato da terra”, “ Beltrano é o homem do sertão”, “Fulano, o candidato do campo” e uma infinidade de outros slogans típicos daquela época eleitoreira. Em uma daquelas jornadas fui parar no interior do Mato Grosso do Sul e mais precisamente em uma pequena cidade às margens do rio das Mortes. À noite e tão logo registrei a minha entrada em uma modesta pensão, fui logo ouvindo do jovem recepcionista: – “ Cuidado com o homem”! Não dei muita atenção àquilo e talvez em função do meu cansaço, após dois longos e quentes dias viajando a bordo de um Ford Scort. No dia seguinte, logo pela manhã, durante algumas visitas a clientes e na companhia do representante da nossa empresa naquela cidade, senti um clima pesado, tenso e por alguns instantes tive a ligeira impressão de não poucos habitantes estarem um tanto apreensivos. À tarde e já de retorno à pensão, o porteiro chamou-me a um canto e por uma janela apontou em direção à rua:- “Aquele é o homem de quem falei; ele é o Sertório”. E em seguida, quase sussurrando, contou-me curiosa estória e o que levou-me a entender o porque daquela pessoa ser tratada de “o homem” naquela cidade e, também, a razão de quase toda a população local estar cabisbaixa e macambúzia: há vinte anos o tal Sertório exercia a função de sacristão da única igreja local. Todos ali tinham imenso carinho por ele até que, um dia, alguém andou dizendo que aquele estimado cidadão virava lobisomem em noites de lua cheia e, para piorar, corria atrás das mocinhas que estavam nas ruas após as dez horas da noite. Então foi ali, naquela pequena cidade às margens do Rio das Mortes onde, pela primeira vez, fui apresentado ao que décadas mais tarde passaria a ser conhecido por “fake news”, a pior das pragas que pode haver, inclusive, durante uma campanha eleitoral, quando a sua divulgação prejudica seriamente a eleição de francos candidatos e de fato comprometidos com o bem-estar e o desenvolvimento dos seus respectivos municípios, sejam eles policiais, profissionais liberais, fazendeiros, empresários, pastores, padres, doutores, líderes comunitários, etc…etc..e…sacristãos! Mas, francamente….. Desde que fui às urnas pela primeira vez, lá pelos idos dos anos setenta, ouço boatos, balelas, petas, fofocas, diz-que-diz e outros rumores desse nível que, hoje, recebe o pomposo nome de “fake news” e o que é pior: muito mais nocivo em razão da velocidade com que é espalhado para dentro de milhões de lares brasileiros mas que, seguramente, acomete apenas aqueles(as) que não estão imunizados/vacinados contra o vírus da astúcia e da malandragem de quem não consegue concorrer a um cargo eletivo por meio da sua inteligência, probidade, seriedade, responsabilidade e sensibilidade pelos interesses do povo. E se aquele Sertório mato-grossense tornava-se um lobisomem em noites de lua cheia, certamente era apenas na cabeça de quem anseia por dramas e suspenses e por esses serem mais fáceis de acreditar do que os fatos pois, contados de maneira muito convincente, boatos terminam muitas vezes acarretando nefastas conseqüências. Durante o período eleitoral o lobisomem, a praga, vem em forma de “fake news” por todo o Brasil e de maneira a comprometer a esperança de milhares e milhares de pessoas sequiosas de progresso, justiça e assistência social. E para combater esse monstro não adianta crucifixos ou litros e litros de água benta mas, sim, uma contínua, voluntária, séria, íntima e suprapartidária educação política já a partir da idade adolescente, aliás como era quando da aplicação da disciplina “OSPB”-Organização Social e Política Brasileira”, na distante década de 70. Um dia, sonho, teremos a felicidade de assistir a um grande numero de jovens de fato politizados e dedicados a entenderem o tema, tanto no sentido prático ( a política das instituições públicas, dos movimentos sociais e dos protestos populares) quanto no sentido teórico ( ideologias e correntes de pensamentos). Somente assim teremos uma grande parcela de brasileiros realmente preparados para defenderem-se do assédio do vírus das fake news, a praga da época de eleições.