Dr. Flávio de Andrade Goulart*

Pintar o sete, bicho de sete cabeças, guardado a sete chaves, enterrado a sete palmos, as sete notas musicais, o sétimo dia da criação, os sete pecados capitais, as sete maravilhas do mundo, as sete cores do arco-íris, os sete dias da semana, os sete sábios da Grécia antiga, Branca de Neve e os sete anões, as sete vidas do gato, as sete virtudes, os sete samurais, Sette Bello, sete de ouros, sete de setembro (que os deuses nos protejam nesta efeméride em 2022!). SETE, eita numerozinho afamado! Como está aberta a temporada eleitoral (apenas formalmente, porque na prática já começou há muito tempo…) desejo trazer aqui minha contribuição aos candidatos ao Executivo e Legislativo no DF, através de propostas relativas à saúde pública em nossa cidade, aqui também organizadas em sete categorias. Antes que me lembrem que SETE é também conta de mentiroso, auguro: que a verdade prevaleça nessas eleições; que os compromissos assumidos por nossos políticos sejam devidamente honrados – e que eles sejam cobrados seriamente quanto a isso.

DESCENTRALIZAÇÃO SIM, COM AS DEVIDAS CAUTELAS
Descentralização efetiva da gestão pública, com autonomia administrativa e financeira das unidades hospitalares e das gerências regionais, através de controle do processo mediante metas de produtividade, impacto e valor bem definidas em instrumentos contratuais, sem esquecer que há profundas implicações culturais ligadas à perda (ou transferência) de poder e que estas devem receber abordagem adequada por parte de quem transfere e também de quem recebe, o que pode ser sintetizado assim: que os bons sejam estimulados e que os inadimplentes pelo menos tenham temor das consequências de seus atos.

UM OLHAR PARA O ENTORNO
Retomada das negociações com os estados vizinhos e seus municípios fronteiriços com o DF, com inclusão do Ministério da Saúde, para definição e compartilhamento de responsabilidades, além da formação de um verdadeiro Sistema Regionalizado de Saúde do Entorno do DF, organizado em redes de atenção, mediante estrutura administrativa Inter federativa (fundação pública, consórcio, associação ou similar), sob gestão profissionalizada e dotada de autonomia, com fortalecimento real dos mecanismos de governança regional do SUS e garantias de progressivo aprimoramento da gestão, incluindo a ampliação de investimentos para a redução de disparidades na locação de serviços de saúde; no desenvolvimento institucional dos órgãos gestores em saúde em municípios e estados envolvidos (MG e GO, além do próprio DF), com monitoramento contínuo.

MODELO ASSISTENCIAL: SEM ATENÇÃO BÁSICA NÃO HÁ SOLUÇÃO

Ampliar recursos e orientar o financiamento para induzir a universalização do SUS, dentro das diretrizes de torna-lo universal, eficiente e de qualidade e mediante o compromisso com um modelo assistencial baseado na Atenção Básica como porta de entrada e instância efetiva de coordenação do sistema, modelo este expandido à totalidade da população, associado à qualificação técnica das equipes com incentivos às inovações assistenciais; gestão da clínica; desenvolvimento de redes de atenção; desenvolvimento de capacidades para fiscalização e controle de prestadores privados; busca de atuação sinérgica entre o setor público e organizações sociais e semelhantes, com decisão política decidida e sustentável, com foco especial no enfrentamento a doenças crônicas não transmissíveis, saúde mental e condições ligadas a estilos de vida e violência urbana.

MODELO DE GESTÃO: ADICIONAR VALOR AO QUE SE FAZ
Agilização e transparência no gasto de recursos, mediante instrumentos de aferição de produtividade, eficiência, oportunidade e impacto sobre a saúde da população, com reestruturação dos processos de licitações, aquisições e compras, controle de estoque e oferta de insumos para a saúde mediante mecanismos eficientes, descentralizados e transparentes, com foco particular nos medicamentos e insumos essenciais. Além disso, buscar formas alternativas de utilização de recursos públicos, sempre dentro da lei, mas fugindo do emaranhado burocrático improdutivo imposto pelas “leis de ferro” do sistema (Estatuto do Funcionário Público – L 8112; Contratos e Licitações – L. 8666, além da Lei de Responsabilidade Fiscal), com qualificação dos gestores públicos para gerenciar efetivamente serviços eventualmente terceirizados, da mesma forma que os serviços próprios do Estado. Fazer valer o princípio de que Saúde enquanto dever do Estado, sendo sua responsabilidade o controle, o financiamento e a gestão do Sistema de Saúde, aprimorando sempre tal modelo através da extensão do direito à saúde a todos os cidadãos, através de promoção, proteção e recuperação da saúde, mediante escolhas que levem em conta os princípios da equidade, da eficiência e da organização do sistema mediante relações de custo-benefício efetivas e de acordo com as evidências científicas disponíveis.

FORÇA DE TRABALHO: VALORIZAÇÃO EM PROL DO BEM COMUM, NÃO DE CORPORATIVISMOS
Restruturação das carreiras profissionais envolvidas com a atenção pública na saúde, que viabilize a contratação, reposição e a qualificação dos recursos humanos para cobertura das carências existentes, com instrumentos de responsabilização contratual de cumprimento de metas assistenciais e gerenciais, com foco em produtividade, qualidade e valor das práticas profissionais, rejeitando formas ilegais ou ilegítimas de vínculos de trabalho, mas não necessariamente dentro da camisa de força estatutária (Lei 8112), com incentivo simultâneo à formação de profissionais de saúde, mediante protagonismo da estrutura pública já organizada ou de outras instituições. Valorização do papel de indução que a SES-DF sobre o mercado de trabalho em saúde na cidade, tendo como focos as necessidades de saúde da população e um modelo de atenção fundado na atenção básica como coordenadora de um sistema constituído em rede, com a definição de agenda para expansão da atuação multiprofissional e em especial a ampliação do escopo de práticas da enfermagem. Redução radical das nomeações em cargos comissionados e de confiança de pessoas fora da carreira da saúde, de forma a evitar expedientes de clientelismo partidário.

PARTICIPAÇÃO, HUMANIZAÇÃO E TRANSPARÊNCIA: SEMPRE!
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Agenda de Governo Aberto agregando participação social, acesso à informação, transparência e humanização de procedimentos junto ao público, além de intercâmbio e busca de colaboração da sociedade civil. Reestruturação da atuação do Conselho de Saúde do DF, de forma a romper com as influências partidárias e corporativas, valorizando e incrementando seu poder de tomar decisões e fazê-las valer de fato e de direito, com ampliação dos mecanismos de participação formais vigentes e utilização de tecnologias de informação e comunicação. Valorização da participação local com o desenvolvimento de novos instrumentos participativos que prescindam da paridade e da pretensão de “poder deliberativo” que fazem parte dos dispositivos atuais, inspirados na Lei 8142.

PENSANDO NO FUTURO
Valorizar e promover a promoção da saúde, tendo como foco especial as condições já apontadas em estudos internacionais como de maior peso em termos de sofrimento humano e também na carga de doença para os anos futuros: saúde mental; AIDS; emergências epidêmicas; alcoolismo e uso de drogas; violências e traumas, com monitoramento constante das políticas públicas em tais campos, aprimorando a atuação dos serviços sob a forma de redes, promovendo estratégias de capacitação e valorização dos profissionais. Fortalecer especialmente o SUS no DF para o enfrentamento de emergências de saúde pública, através de estrutura de governança técnica e qualificada que centralize funções relacionadas a emergências sanitárias, com o desenvolvimento de instrumentos de planejamento e de estratégias de comunicação transparentes e baseadas em evidências. Considerar os Determinantes Sociais da Saúde na formulação de políticas e programas de saúde, visando reduzir de fato as desigualdades resultantes de fatores sociais, econômicos, culturais, étnicos/raciais, psicológicos e comportamentais que influenciam a ocorrência de problemas de saúde e ampliam iniquidades, com foco em tópicos como segurança alimentar, habitação, educação, emprego e renda e também para as especificidades dos mais vulneráveis: negros , mulheres, indígenas, LGBTQIA+, pessoas com deficiência, pessoas com transtornos mentais e em situação de rua.

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Então? Como reagiria Pinóquio diante dessas propostas? Será que ele as endossaria? Eu próprio devo dizer que elas estão em total estado genérico, se me permitem. Estão sendo trazidas é para debate. Cada uma delas pode e deve ser desdobrada intensivamente. É este o objetivo da presente notícia. Uma coisa é certa: nossa cidade merece mais, muito mais, não só em matéria de saúde, mas também na educação, ação social, trânsito, transportes públicos e tanta coisa mais. Tudo isso tem jeito… Depende de nós.

*Flávio de Andrade Goulart é médico, professor de Medicina na UFU e na UNB, secretário municipal de Saúde em Uberlândia e é sobrinho do poeta Carlos Drummond de Andrade.