Dr, Flávio de Andrade Goulart*

Prossigo hoje na apresentação iniciada na última semana de alguns dados do Boletim IEPS – Data, publicado pelo Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS) de São Paulo, sobre a evolução dos principais indicadores de mortalidade e morbidade em municípios e estados brasileiros. Hoje é feita a comparação entre os dados da Capital Federal, cotejados com outras capitais brasileiras, selecionadas por representação regional e população. Veja a tabela a seguir, com comentários mais adiante.
INDICADOR BRASÍLIA GOIANIA B. H. BELEM FORTAL. CTBA
EXPECTATIVA DE VIDA (anos) 77,4 75,3 76,4 74,3 74,4 76,3
POPULAÇÃO > 60 ANOS (%) 7,9 9,5 13,2 9,3 9 11,8
SANEAMENTO BÁSICO (%) 99,0 74,6 94,1 66,2 72,1 94
MORTALIDADE CAUSAS EVITÁVEIS (por 100 mil hab) 66,6 86,1 68,1 106,3 79,4 59,0
INTERNAÇÕES CSAP (por 100 mil hab) 763,4 513,6 748,5 663,3 714,2 718,4
COBERTURA ATENÇÃO BÁSICA (%) 63,2 62,7 100 48,5 60,3 63,3
COBERTURA VACINAÇÃO POLIO (%) 73,2 72,6 67,9 50,8 73,2 79,0
% NASCIDOS VIVOS PRENATAL OK (%) 71,6 74,6 84,3 56,1 65,4 86,7
MÉDICOS (por 01 mil hab) 3,92 4,27 5,97 2,3 3,19 3,54
ENFERMEIROS (por mil hab) 2,53 1,88 2,55 1,24 2,16 1,67
LEITOS SUS (por 100 mil hab) 167,63 247,31 204,84 181,56 219,6 151,75
LEITOS NÃO SUS (por 100 mil hab) 151,12 231,86 139,55 101,84 131,94 89.69
DESPESAS SAÚDE / hab (R$) – 1161, 2110, 752, 970, 1343,
DESPESAS REC PRÓPRIOS / hab (R$) – 532, 672, 384, 488, 605,
Essas informações mantêm correspondência imediata – ou assim o deveriam – com as condições socioeconômicas locais, mas nem sempre tal correlação é evidente, entre outras razões por problemas na coleta ou processamento das informações. Como exemplo, em Belém, que pode ser considerada uma cidade com indicadores sociais mais precários e onde a cobertura por atenção básica é a menor da série, o índice de internação por condições sensíveis à tal estratégia é simplesmente a segunda menor entre todas, atrás apenas de Goiânia, enquanto sua mortalidade por causas evitáveis é simplesmente a maior de todas.
Mas feita tal ressalva, sigamos em frente.
A expectativa de vida não varia intensamente entre os casos apresentados, apenas 3,1 pontos entre a maior e a menor cifra, mas de toda forma os valores maiores verificados em Brasília e Curitiba seriam compatíveis com uma estimativa socioeconômica sem dúvida mais favorável nessas duas cidades.
Da mesma forma, em termos da população acima de 60 anos, o maior índice de juventude encontrado em Brasília também soa verossímil, distanciando-se mais intensamente dos casos de Curitiba e Belo Horizonte
No saneamento básico, como seria de se esperar, o DF está na frente, porém seguido de perto por Curitiba e Belo Horizonte, com maior distanciamento de Belém, Goiânia e Fortaleza.
Uma avaliação da qualidade da atenção básica pode ser apreciada a partir de alguns indicadores, nominalmente mortalidade por causas evitáveis, internações por CSAP, cobertura da atenção básica, cobertura de vacinação anti-pólio e proporção de nascidos vivos com pré-natal completo. Verifica-se aí alguma discrepância, por exemplo entre as cifras de mortalidade por causas evitáveis e internações por CSAP, que deveriam estar correlacionadas, mas nem sempre estão. Em Brasília, por exemplo, a baixa mortalidade evitável, uma das menores da série, corresponde ao maior índice de CSAP. De toda forma não parece haver uma correlação direta entre a cobertura da atenção básica e estes dois indicadores, embora no caso de Belém a pequena cobertura da AB parece se refletir no alto índice de mortalidade evitável.
Até certo ponto discrepante, também, seria a correlação entre cobertura vacinal anti-pólio e de pré-natal vis a visa com a cobertura pela AB, tomando como parâmetro o caso de BH, onde os 100% de cobertura pela atenção básica não parecem produzir resultado melhor em vacinação do que em outras capitais com coberturas de AB mais reduzidas. Mas mesmo neste caso é preciso averiguar outros fatores presentes, pois no caso da atenção pré-natal, BH e Curitiba estão muito próximos, embora mantenham diferenças significativas na cobertura da AB. Mais uma vez, todavia, a situação de Belém parece reforçar a suposição de que a baixa cobertura de AB corresponderia e maus indicadores relativos à vacinação, pré-natal e mortalidade evitável.
Em termos de e enfermeiros por mil habitantes, o quadro é de grande variabilidade entre as capitais estudadas, mas podem ser apontados alguns aspectos notáveis. Assim, neste levantamento, ao contrário de outros (como na publicação Demografia Médica, do Cremesp), o DF não é o primeiro lugar em matéria de população de médicos no país, sendo superado por Goiânia e BH, pelo menos. Em termos de enfermeiros possui o DF situação de destaque, com cifras equivalentes às de BH e bem superiores às de Belém e Curitiba.
Em termos de leitos por habitante a situação do DF é também até certo ponto inesperada, pois está distante de ser a mais bem aquinhoada da série. Ao contrário, só é inferior à de Curitiba. Em todas essas cidades há visível regularidade na distribuição de tais leitos, com predomínio do setor público em todas elas, com proximidade de equalização entre público e privado vista apenas no caso de Brasília e de Goiânia.
No caso das despesas com saúde a análise fica prejudicada em primeiro lugar pela aparente não regularidade dos dados e em segundo lugar parla inesperada ausência de dados do DF no presente levantamento.
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*Professor doutor em Medicina. Sobrinho do poeta Carlos Drumnnd de Andrade