Marília Cunha – Educadora e escritora – Uberlândia – MG

Navegando na internet encontrei um interessante artigo – Língua e tradição – escrito por Aldo Bizzocchi, doutor em linguística pela USP e pesquisador do NENIAP – USP. Neste artigo o ilustre linguista reporta-se à Academia Brasileira de Letras, desde a sua fundação até os dias de hoje e ressalta a sua importância como guardiã da língua portuguesa no Brasil e de sua literatura.
O artigo é focado em prática da Academia que tem sido costumeira, desde os primórdios, mas tem se acentuado atualmente, elegendo membros que pouco ou quase nada contribuíram para o enriquecimento do idioma e sua literatura. Membros que apenas exerciam influência política e popular. Dá como exemplo a eleição dos ex-presidentes da república José Sarney (escreveu “Marimbondos de Fogo”, citado pelo autor do artigo, ironicamente, como grande monumento de nossas letras) e Fernando Henrique Cardoso e seus textos acadêmicos (os quais ele pediu que fossem esquecidos). A seguir veio o letrista, escritor, místico e ex-hippie Paulo Coelho, que não permite que seus erros gramaticais e ortográficos sejam corrigidos porque, segundo sua visão, “Deus pode estar num erro de português”. A ABL admitiu, mais recentemente os letristas de MPB Geraldo Carneiro, Antônio Cícero, Gilberto Gil, a atriz Fernando Montenegro, o cineasta Cacá Diegues e o jornalista e comentarista Merval pereira, atual presidente da casa.
Na visão de Aldo Bizzochi, não se pode negar talento a alguns destes nomes ou o valor artístico de suas obras. Mas teceu considerações sobre o fato: se a Academia visa contemplar personalidades que muito contribuem para o engrandecimento do idioma e sua produção literária, deveria então agraciar os produtores de texto e não simples reprodutores, como é o caso de Fernanda Montenegro. A atriz nunca escreveu uma linha em termos literários ( seu único livro é um autobiografia) e ela apenas reproduz nos palcos, oralmente, os textos de outrem. Não se discute a qualidade dos versos de Gilberto Gil. Mas seu registro escrito se encontra basicamente nos encartes de LPs e CDs.
E por que Chico Buarque de Holanda, nosso maior letrista e poeta, vencedor do prêmio Camões não está na academia? E por que Monteiro Lobato, Carlos Drummond de Andrade , Cacília Meireles, Vinicius de Moraes, Clarice Lispector, Érico Veríssimo e Mário Quintana nunca estiveram?

Para fazer parte de uma academia de letras, pensa o linguista, deve se fazer presente que o membro tenha produzido obras de relevo em termos culturais e linguísticos e que tenha dado contribuição significativa ao idioma. O atual critério parece ser mais político ou mercadológico do que de mérito acadêmico ou cultural.

Este artigo, do qual apenas apresentei um resumo, é
interessante e inteligente. Vale a pena ler por inteiro e
apreciar as ideias nele contidas. Nos comentários feitos
por leitores, um deles acrescenta que, apesar de Machado
de Assis levar os créditos pela fundação da ABL, ela foi
idealizada por Julia Lopes de Almeida, uma escritora que
foi apagada da história e que não pode ocupar a cadeira
pelo machismo estrutural da época. Será?

Marília Alves Cunha