Marília Alves Cunha – Educadora e escritora – Uberlândia – MG

“Vamos pegar nossos livros e canetas. Eles são nossas armas poderosas. Uma criança, um professor, uma caneta e um livro podem mudar o mundo.” (Malala Yousafzai)

A LEI DE COTAS, de 29/08/2012, que instituiu o sistema de cotas amplamente conhecido por todos, tem por objetivo abrir as portas das universidades públicas, facilitar a entrada nas universidades de pessoas que estivessem concorrendo às vagas em condições menos favoráveis que outras. Vários fatores pesam e contribuem nesta defasagem de aprendizagem, inclusive os sócio-econômicos e de raça. São, pois, pontos a considerar na aprovação de cotistas.

À época, o Ministro da Educação Aluizio Mercadante afirmou que a lei seria aplicada progressivamente nos próximos 4 anos e a vigência da política afirmativa seria inicialmente de 10 anos. Considerou o Ministro: “A política de ações afirmativas é sempre feita de forma temporária. O objetivo dela é corrigir uma distorção”.

A lei vai se distanciando do prazo de 10 anos e, pelo visto, tornar-se-à definitiva, pois não se fala em cumprimento de objetivos ou na intenção de revogá-la ou modificá-la. A meu ver a principal e talvez única distorção não foi corrigida nem levada em consideração: oferecer aos alunos de escola pública, no ensino fundamental e médio, uma grande melhoria no ensino, uma escola de real qualidade, para que no futuro não fossem qualificados como cotistas. Por que a falha histórica em não se interessar pela melhoria do ensino básico? Porque não empreender com seriedade uma política voltada ao ensino público de qualidade, com investimentos maciços que mudem a situação, para que os alunos da rede pública não precisem ser discriminado por um sistema de cotas que os indicam incapazes de concorrer em igualdade de condições com alunos da rede privada?

Será que o sistema de cotas têm contribuído, não só com a entrada de cotistas, mas também no sentido de que as universidades atinjam seu nível de excelência como o aguardado? Será que houve progressos no nível cultural dos alunos, capacitando-os amplamente para uma vida profissional de alto grau? Li, dia desses, uma noticia preocupante. A Escola Politécnica da Universidade Federal do Rio de janeiro, fundada em 1792 é a sétima escola de engenharia mais antiga do mundo e a mais antiga das Américas. É a 1ª. instituição de ensino superior no Brasil e considerada uma das melhores da América latina no ensino de engenharia. Esta escola introduz agora uma novidade: pretende tornar a disciplina de Cálculo mais fácil, para diminuir o índice de reprovação de alunos, especialmente entre os alunos cotistas.
Link da matéria:

Escola Politécnica da UFRJ vai mexer no curso de Cálculo para reduzir taxas de reprovação

Está aí demonstrado o ciclo de mediocridade que se produz no Brasil: não se reforça a educação básica, não formando alunos mais capazes de ingressar numa universidade. Criam-se cotas para alunos incapazes de entrar, normalmente, num curso universitário, por falta de uma melhor base. Se os alunos começam a ser reprovados em altas porcentagens, rebaixa-se o nível dos cursos ao nível dos alunos, ao invés de elevar os alunos ao nível dos cursos, a um nível superior.

A diretora da instituição reconhece que 70% de reprovação não é normal. Existe inclusive um Curso de Cálculos André Rebouças, projeto de apoio pedagógico para alunos cotistas da engenharia. Não considero, como alguns, a grande taxa de reprovação uma forma de racismo institucional. O erro vem do passado, quando não foi oferecido a estes alunos uma escola pública de qualidade, para que tivessem uma sólida base de conhecimentos ao ingressar numa universidade.

E assim vamos, empurrando com a barriga. Mais fácil do que procurar e trabalhar a origem do problema é facilitar as coisas. Se a moda pega, estamos no caminho do desastre! Teremos, cada vez mais, um nível de profissionais que, certamente, não atenderá da maneira que se espera, às exigências das profissões.

E continuaremos errando, em todos os níveis da educação? Os ciclos se fecharão cada vez mais e a qualidade do ensino se mostrará pior a cada dia? Não é deteriorando e tornando mais fáceis os conteúdos que atingiremos os objetivos de um ensino de qualidade. Pelo contrário, ficaremos ainda pior do que somos…

Os organizadores do Curso André Rebouças, consideram a decisão de alterar e tornar mais fácil o conteúdo da disciplina, uma vitória histórica para reduzir reprovação. Da minha parte e de muitos, isto pode ser considerado a vitória da mediocridade e do simplismo na educação, o que já temos visto acontecer em outros níveis. Está difícil? Está havendo reprovação e evasão de alunos? Vamos, então, tornar tudo mais fácil e mais digerível. Vamos simplificando as coisas e exterminando as exigências para que tudo se santifique e dê “bons” resultados. Depois, basta recolher os cacos que sobram…