José Carlos Nunes Barreto*

Eu tenho um sonho: que os negros e os brancos andassem em irmandade, e, sentassem na mesma mesa em paz. (Martin Luther King)

Escrevo às vésperas do dia nacional da consciência negra. Dia da morte de Zumbi dos Palmares, líder da resistência dos negros, contra a escravidão. Que continua. Sob outra forma pior, como mostrarei a seguir… E o IBGE joga luz no assunto: no racismo dissimulado, que os números não deixam mentir: Como explicar que o aumento da escolaridade, possa elevar o fosso, entre a renda  dos pardos/ negros, e os brancos? E, que em média , entre todas as faixas salariais , os mesmos ganhem 51,1% dos salários dos brancos?

Filho de pai branco e mãe negra não sou xiita. Mas, sempre me assumi negro, e , apesar de tudo, amo a negritude.. . Até porque, só isso podia explicar as vitórias, em nome de Deus, após  tantos nãos, ao longo da vida. Para um menino pouco quieto, e perguntador. Para um jovem namorador, que acreditava no amor, sem a barreira da epiderme. Para um velho professor, com 30 anos de experiência em salas de aula, ensinando tudo que sabia, não importando a cor, de quem quer que fosse. Ultimamente, na Pós Graduação da Academia, sem ver os negros, como meus alunos, volto a afirmar: não se constrói uma nação desse jeito:  A pobreza tem cor e ela é negra. E, afirmo categoricamente: essa pobreza,  está sendo construída há centenas de anos, institucionalmente no País… A riqueza também tem cor, e ela  é branca , desde sempre. Daí porque, precisamos de outros Zumbis .  Outra resistência, porque cerca de dois milhões de jovens negros (até 22 anos)e de baixa escolaridade, só entre o Rio e São Paulo, por não terem  positivas lideranças, estão prestes a entrar nas fileiras do crime organizado, e aí sim, virão engrossar as estatísticas de morte de jovens negros, lutando contra a polícia… Um verdadeiro genocídio. Ou, quem sabe, os sobreviventes, irão adentrar em  caras prisões, e sofrerão depois,  porque não tiveram sequer  baratas escolas, e mal pagos professores.

Entre  aqueles  que estão desempregados ,diz o IBGE, a esmagadora maioria é  negra ou parda. E o poeta já dizia que, “ sem o seu trabalho / um homem não tem honra/ E sem a sua honra, se mata ./Se morre/ Não dá pra ser feliz”. Principalmente porque, no bairro ao lado, a opulência afronta: carros blindados, com segurança…Mansões , festas nababescas, e escarnecedoras( muitas delas feitas com desvios de dinheiro público) , a que seus irmãos, só tem acesso pelo  elevador de serviço( Já que outra pesquisa  do IBGE.  mostra também que, negros e pardos, só são maioria, no mercado de construção civil ,e, como domésticos!)

Pobre Brasil dos negros! Rico Brasil dos brancos! Uma mama África – mãe solteira, pobre e sofredora, e uma européia bem nascida , quatrocentona e de  sangue azul.  Duas nações superpostas, no mesmo espaço físico.

Claro que os negros estão por baixo. E, não importa quão ricos e intelectuais eles sejam. Quão famosos e elegantes se apresentem. Esta é uma constatação, de todos afrodescendentes (uma palavra que a direita radical odeia, e que eu adoro, por mostrar nossas raízes) que, como eu, à duras penas, conseguiram ascender às classes A/B.

Ações civis públicas contra o racismo, estão sendo construídas  contra estes números, e começam a romper o silêncio constrangedor, a que se referia Martin Luther King… A moderna escravidão, a que estão sujeitos muitos dos irmãos pardos e negros, é  a gerada pela falta de escolaridade, em plena  era do conhecimento. “O sol da liberdade em raios fúlgidos” é para esses brasileiros, aprenderem a aprender. Para romper o dia de amanhã  sem  grilhões, imateriais que sejam.

*Pós doutor, sócio da DEBATEF e editor da Revista SCIENCOMM