Gustavo Hoffay

A cada vez que tomo conhecimento da prisão ou morte de um jovem em função do uso que fazia de drogas, logo penso em seus pais e no quanto eles desejavam que aquele rapaz se comportasse sempre de maneira sóbria e consciente, em família e na sociedade. Entretanto muitos deles terminam envolvendo-se em comportamentos insdequados que a cada dia tornam-se mais e mais comuns e dada a sua impotência em dizer “não”, quando alguma droga lhe é oferecida. Diariamente, ao longo das minhas caminhadas diárias, passo ao largo de um pequeno campo de terra batida e onde, à tardinha, crianças e adolescentes aparentemente recém chegados da escola participam de um jogo de futebol. Ligeiras discussões e gritos misturam-se a breves momentos de tormento, alegria, sorrisos e exultação. Permito-me, então, um brevíssimo intervalo em meus exercitantes e alongados passos, para apreciar a peleja. Um dia, penso, eles tomaram consciência de viverem um momento que é um ensaio ou um noviciado para o seu futuro; uma passagem para a sua plenitude cultural, para o árduo e adulto exercício cotidiano da vida. O simples “passar a bola” de pé em pé, o “passar adiante” atenta-os para a importância de serem sempre organizados e disciplinados, onde quer que venham a situar-se durante a vida. Aos poucos, quero imaginar, eles descobrem que o bom time é composto por jogadores que não mantêm a bola egoisticamente sob o seu domínio, pois isso sufocaria, impediria jogadas em conjunto e rumo ao gol adversário. O jogo de futebol entre aqueles jovens não os asfixia, pois é praticado em conjunto e talvez por já terem chegado à conclusão de que o egoísmo sufoca. A felicidade é algo dinâmico; deve estar em constante circulação; daí eu presumir que a regra suprema daqueles jovens seja sempre passar a bola à frente, em qualquer circunstância. Porém, contrariamente, curioso fenômeno salta aos olhos e especialmente de muitos de nós que lidamos na área da assistência social: na passagem de um quase anonimato para o palco da vida que abre-se à sua frente e sob os atentos olhares da sociedade, muitos ainda são os jovens que parecem entregar-se ao desespero ou ao tédio da vida, embalados por vícios e hábitos que prenunciam um futuro duvidoso e sombrio para cada um deles. E porquê? Penso que para essa pergunta a grande maioria deles não teria resposta, sequer para si mesmo e dado o mal-estar difuso em que vivem muitos deles: falta de espiritualidade, o assédio constante das drogas, a família desarticulada, as incertezas quanto ao futuro e olhos prematuramente abertos para uma realidade que, de tão brutal, deixa assustados até os mais experientes viventes. São jovens que assistem indolentemente a chegada da sua própria velhice aos vinte e poucos anos de idade. E a ocorrência de tal fenômeno já preocupa há tempos algumas autoridades. Se é elevado o número de rapazes e moças nessa situação, por outro lado existem jovens dotados de razão e muito capazes de surpreender positivamente, por meio de atitudes virtuosas e de desprendimento. São jovens que saem de si mesmos, rompem o seu isolamento e abrem-se para a vida. Para esses, entretanto, não me canso de dizer: no mundo atual até o “viver feliz” envolve riscos. E um desses riscos é o de entregarem-se demasiadamente a outros. Um risco que todavia ainda é preferível à certeza de que não se abrindo, ocorrerá a atrofia da sua alma e o aumento da insolvência de muitos desvalidos.

Agente Social