“O cinema é infinito (…) Cada imagem só existe
interligada à que a antecede e a que a sucede.”
(Vinicius de Moraes).
A programação de filmes na televisão com seus enfadonhos repetecos proporciona aos cinemeiros, com constância, a ensancha de poderem comparar distintas versões de uma mesma história. Assim aconteceu, dias atrás, ao vermos o mais recente lançamento de “Grande Gatsby”. Este tipo de avaliação também prevalece para outras películas conhecidas. Mencionemo-las: “Ben-Hur”, “A Noviça Rebelde”, “Sabrina”, “Sete homens e um destino”, “Doze homens e uma sentença”.
A trajetória de o “Grande Gatsby”, adaptação para o cinema de um romance de Scott Fitzgerald, comporta já a partir de 1926 quatro versões. A primeira delas traz Warner Baxter no papel central. Em 1949, Alan Ladd, protagonista de um faroeste que marcou época – “Os brutos também amam” -, um baixinho que subia em caixotes para poder contracenar com atrizes mais altas, vive o personagem central. Robert Redford e Mia Farrow lideram o elenco na projeção de 1965. Agora, em 2016, Leonardo DiCaprio é o astro escolhido para interpretar a enigmática figura que dá título ao filme, um milionário que promove suntuosas noitadas festivas em sua mansão, reunindo aristocratas e artistas. Confrontada com a produção anterior, essa última é de doer. Não consegue reproduzir, um tiquinho que seja, o charme, padrão técnico e artístico da versão mais famosa (1965).
Outro fiasco monumental caracteriza a versão exibida pouco tempo atrás de “A Noviça Rebelde”. Tirante as inesquecíveis melodias, nada no “novo filme” lembra a saborosa narrativa referente à noviça de um convento, refratária a regras, que na condição de governanta revira de cabeça pra baixo, trazendo muita alegria e vibração, alterando radicalmente os hábitos do lugar, mansão habitada por rígido militar e seus sete filhos. O “A Noviça Rebelde” recebido a princípio com restrições pela crítica, mas aclamado o tempo todo pelo público, foi dirigido por Robert Wise. O destaque no time de atores pertence a Julie Andrews, Christopher Plummer, Eleanor Parker e Richard Haydn.
No “Ben-Hur” de seis décadas atrás, Charlton Heston é Judah, príncipe judeu injustamente acusado de traição, junto com a mãe e irmã, pelo oficial romano Messala, amigo de infância. Sobrevivendo às galés, adotado por um nobre romano a quem salva da morte num naufrágio, Judah retorna à Judeia e enfrenta Messala numa corrida de bigas apontada como um dos momentos mais eletrizantes da cinematografia. Stephen Boyd é o oficial romano na trama. Pouca gente sabe que o autor do enredo, Gore Vidal, insinuou em seu trabalho que existiria uma ligação homossexual entre Judah e Messala. Esse enfoque foi descartado na realização da fita. Ano passado, com Jack Huston (Judah), Toby Kebbell (Messala), Morgan Freeman (mercador que se torna amigo do príncipe judeu) e o brasileiro Rodrigo Santoro (que interpreta Jesus crucificado), lançou-se nova versão de “Ben-Hur”. A diferença de qualidade entre os dois filmes é de tal monta que se faz possível valermo-nos de metáfora para uma explicação: o primeiro “Ben-Hur” está para o segundo assim como o desempenho da seleção brasileira de futebol que levantou o Tri no México está para o desempenho da seleção dos vexatórios sete a um no Mineirão.
A comédia romântica “Sabrina” de 1954, com a meiga Audrey Hepburn, Humphrey Bogart e William Holden, mesmo tendo saído ao agrado do público e da crítica, não resiste, falar verdade, a um confronto com a “Sabrina” de 1995, estrelada por Harisson Ford, Julia Ormond e Greg Kinnear. A historieta da jovem filha de motorista cortejada por dois irmãos, um deles play boy, o outro compenetrado executivo de poderoso conglomerado empresarial familiar, revela-se bem mais glamorosa e interessante no segundo momento.
O clássico “Sete homens e um destino”, faroeste inspirado no célebre “Os sete samurais”, de Akira Kurosawa, foi lançado numa segunda versão em 2016, com Denzel Washington à testa do elenco. O filme bateu recorde de bilheteria. Em que pese o ritmo eletrizante da narrativa, bem ao gosto dos aficionados das películas de ação, a versão de 1960, que traz Yul Brynner como protagonista principal, merece ser apontada como de feição artística superior.
Chegamos, por último, nesta singela avaliação comparativa, a um dos maiores filmes de todos os tempos: “Doze homens e uma sentença”. Na versão de 1967, com o excelente Henry Fonda e um soberbo conjunto de atores, direção de Sidney Lumet, a cinematografia atinge um de seus instantes de mais raro esplendor. Na versão de 1997, com Jack Lemmon igualmente encabeçando portentoso grupo de intérpretes, dirigidos por Willian Friedkin, defrontamo-nos com outro celuloide de inspiração requintada, em condições de também galgar pódio na arte cinematográfica.
* Jornalista (cantonius1@yahoo.com.br)