Schyrley Pimenta*

A neurocientista britânica Susan Greenfield alerta para o impacto das novas tecnologias e seus efeitos bioquímicos no cérebro humano, que se revelam muito semelhantes ao vício em drogas. Pesquisas relacionadas ao tema mostram um aumento de problemas de compreensão verbal e de declínio na capacidade de empatia, do nosso jeito humano de colocar-se no lugar do outro.
A neurocientista não nega os indícios de que o uso de videogames podem melhorar a agilidade mental, bem como a memória de curto prazo. A questão é que a capacidade de processar rapidamente as informações não equivale a compreensão e sabedoria.
O texto de Pasquale Cipro Neto, publicado no caderno Cotidiano (Folha de São Paulo, 20/09/12), de certa forma reitera as preocupações de Greenfield, quando faz referência às “leituras tortas”, muito em voga atualmente, e que são decorrentes de uma deficiência no raciocínio lógico do leitor. Entre outros exemplos, o articulista cita o texto da psicanalista Maria Rita kehl (Folha Ilustrissíma, 16/09/12) que foi alvo de comentários e críticas, raivosas e grosseiras, na versão eletrônica do referido jornal, fruto dessa famigerada “leitura torta”, desse “analfabetismo funcional”.
Como sanar tal lacuna? A sugestão de Cipro é uma só: ler, ler e ler, incluindo na leitura um pouco de filosofia, de música, de poesia. E vai mais longe: há que ler muito, mas não qualquer texto, mal e porcamente alinhavado; há que ler o texto “que desarma o espírito, eleva e enleva a alma”. E isso, convenhamos, começa muito cedo: tem início com as canções de ninar, com a contação de histórias, com um bem fundamentado processo de alfabetização, com um contínuo estímulo à leitura e à expressão das ideias.
Se não for assim, a informação rasa e narcísica continuará crescendo. Haja vista a popularização das câmaras e redes de compartilhamento, que parecem ter acordado nas pessoas uma compulsão à expressão individual, marcada pela banalidade, quando não pelo fútil, pelo grosseiro, pelo ridículo. Para Luli Radfahrer (Folha de São Paulo, 10/09/12), o usuário de redes sociais hoje chega a superar o Narciso mitológico, na sua paixão desenfreada por uma tela de computador, na qual sucumbe, ao confundi-la com a realidade.
O espetáculo é triste e melancólico. Ambientes tais, que permitem tamanho exibicionismo e a manifestação de múltiplas identidades, demandam, afirma Radfahrer, coerência de pensamento, “para que seus atores não se tornem reféns das personagens que representam”. Mas… e a coerência de pensamento? Por onde anda? E aqui, voltamos a Pasquale Cipro (Caderno Cotidiano, Folha de São Paulo, 09/08/12) que lamenta os tempos magros e insossos de hoje em que nos falta repertório e conhecimento histórico para ler, compreender e interpretar textos, parágrafos de textos, metáforas, ironias. E, como exemplo, cita versos da célebre canção “Pesadelo” (letra de Paulo César Pinheiro e melodia de Maurício Tapajós): “Quando um muro separa, uma ponte une/ (…) Você vem me agarra/ Alguém vem me solta / (…) E se a força é tua ela um dia é nossa / (…)Olha o muro, olha a ponte, Olha o dia de ontem chegando / Que medo você tem de nós, olha aí / Você corta um verso, eu escrevo outro / Você me prende vivo, eu escapo morto / De repente olha eu de novo / (…).

Psicóloga clínica – shyrleypimenta@gmail.com