Primeiro surge a grande bolha, em seguida surge o grande consenso sob ideias vendiam a possibilidade de desenvolvimento na ausência de sacrifícios, com isto surge a grande euforia, pautada no discurso ufanista estruturado no jargão “nunca antes”, após tudo isso surge o choque de realidade, e com ele surge a grande frustração, seguido pela grande crise que promove um grande mal estar, e após demorados anos surge o grande pessimismo e em meio a tamanha tragédia, vivemos hoje a morte das utopias.
A morte das utopias emerge num momento em que o ano de 2017 se dá como outro ano perdido, outro entre tantos em meio a nossa história recente, é possível que estejamos diante de uma década perdida, em aspectos econômicos com certeza será, dado que nossas médias de crescimento estão condenadas a um desempenho próximo de 1% ao ano. O custo em termos de desemprego, queda na renda e mal estar material promovido por um desempenho tão medíocre em uma década, parece alto no curto prazo, dado que estes fatores interferem diretamente na nossa qualidade de vida e cidadania. No entanto, este custo se torna desprezível num horizonte de longuíssimo prazo, de 50 ou 60 anos, se sob os aspectos dos valores, os aprendizados com a crise atual, migrar este período de uma década perdida, para uma década encontrada.
No último dia 31/03 ocupei este espaço escrevendo um artigo intitulado “A armadilha da meia melhora”, nele alertava sobre os riscos de um pequeno alívio econômico que se punha no início deste ano, estar acompanhada de uma anestesia política que não alterasse o nosso comportamento social no campo dos valores. Em outras palavras, disse que uma meia melhora econômica desacompanhada de uma considerável melhora nos hábitos e na administração pública, seria apenas um intervalo temporal entre a crise atual e a próxima, dados que os fundamentos da patologia que atiraram o país na maior depressão da história, não estavam em conteste.
Hoje, pouco mais de 6 semanas desde a publicação do supracitado artigo, acompanhamos com espanto (mas não surpresa), o flagrante que envolve o presidente em exercício e um dos principais presidenciáveis para as eleições de 2018 em um esquema repugnante de chantagem, propina e obstrução da justiça. Diante da podridão que veio à luz esta semana, uma conclusão, o intervalo entre a crise atual desenhada na “Armadilha da meia melhora” e a próxima crise, foi curto, e a meia melhora antes anunciada cederá espaço para uma grande piora, e tudo isto tem como principal causa a morte das utopias.
É preciso ressuscitar as utopias para que o país volte a ter esperança, isso só será possível, se a melhora econômica vier precedida de uma melhora nos valores cultivados socialmente, mas quais são eles?
O primeiro valor a ser perseguido pela sociedade emergente é a democracia como valor inegociável. Além deste, a defesa das liberdades individuais, que incluem liberdade de imprensa, fundamental na divulgação e no registro de tudo que está sendo passado a limpo, mas também as liberdades de expressão e de livre iniciativa. Devemos ainda perseguir como valores a ética e a moralidade na vida pública, são aspectos distintos, no que se refere a primeira, tem-se o rigoroso cumprimento das leis (desde o código penal, até as simples leis orçamentárias que foram desrespeitadas por aqueles que se julgam acima da lei), no que se refere a segunda, tem-se aquilo que é permitido pela lei, mas não é moral, ou é tido como privilégio aos olhos de quem está de fora (supersalários, por exemplo). É preciso ter isonomia de regras e oportunidades, privilegiar a meritocracia frente aos lobbys. E finalmente é preciso que o governo seja institucional, com papéis bem definidos para cada instituição e que tais instituições sejam guardiãs de princípios e valores e não de interesses particulares como hora acompanhamos com desgosto nos noticiário.
*Bacharel e mestre em economia – www.benitosalomao.com