Gustavo Hoffay*

Durante o decorrer de quase dez anos, tive o privilégio de tê-lo por companhia quase diária e várias foram as vezes que pude testemunhar o quanto ele era um fervoroso amante das letras. Filósofo, teólogo, doutor em letras clássicas e professor na Universidade Federal de Uberlândia, Frei Antonino, ex-vigário em Uberaba e Carmo do Paranaíba e capelão da Cruz Vermelha, era um homem contemplado por virtudes raramente vistas entre a grande maioria dos seus contemporâneos. Leitor voraz e assíduo de jornais, livros e revistas diversos, não foram poucas as vezes que o surpreendi debruçado sobre algumas páginas abertas à sua frente, enquanto sentado à mesa de leituras da casa paroquial onde residia, no bairro Tibery. Frei Antonino-tradutor e comentarista de grandes obras literárias de autores gregos, não raramente brindava a muitos com algumas lições – verdadeiras pérolas – retiradas do seu profundo poço de sabedoria. Enquanto em nossas andanças diárias por Uberlândia e algumas vezes por Araguari e Uberaba, onde eu o levava para visitar seus antigos confrades italianos, aquele religioso siciliano sempre me ofertava sábias e particulares preleções, dotadas de lastro de conhecimento sobre variados e numerosos temas, algumas das quais eu fazia questão de anotar e ainda trago guardadas com especial enlevo. Entre elas destaco a que ele referia-se ao termo “coitado”: – Nunca trate uma pessoa por esse adjetivo, pois sem querer você estará qualificando-a como a uma pessoa que foi objeto ou alvo de um coito, de um ato sexual; coitado, dizia ele, é o particípio passado do verbo “coitar”! Tempos depois, na minha presença, ele chamou à atenção um amigo seu e conhecido comerciante lá das bandas do bairro Martins, que disse-lhe estar passando por uma situação precária. Espantei-me ao ouvir o Frei Antonino dizer àquele pequeno lojista que bom seria se o mesmo continuasse, até indefinidamente, naquele estado de precariedade, pois Deus conserva-nos a cada instante e não apenas por meio da sua onipotência, mas também em vista da nossa fé, das nossas preces. Em seguida, constatando a nossa estranheza em relação ao que acabara de dizer e diante da dita precariedade daquele seu amigo, Frei Antonino, com um dedo em riste, logo arrematou: – Seus bobões! A palavra “precário” vem de “prece”, logo precário é aquilo que existe por efeito de prece, sustentado pela prece. Nenhum de nós é senhor da sua vida. Foi Deus quem nos criou e nos mantêm em razão da nossa…..prece; logo, somos todos….. precários! E antes de despedirmos daquele seu amigo, Frei Antonino finalizou: – Continue fervorosamente precário, pois a prece é como a respiração da alma. E para orar não é necessário ter méritos; basta ter amor ao bem! Grande Santino Puglisi, grande Frei Antonino! Nunca mais me referi a alguém por coitado e nunca tornei a considerar-me coitado, mas felizmente sou e continuarei sendo um sujeito precário, graças a Deus!

Gustavo Hoffay – Agente Social- Uberlândia(MG)