Autor: Rafael Moia Filho*

Os desembargadores do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ/MG) recebem mais de dez vezes o teto do funcionalismo. Neste ano que terminou, as vantagens superaram mais de 10 vezes o teto constitucional de R$ 39,3 mil. Em agosto/21, por exemplo, um desembargador recebeu R$ 563,6 mil.
Os vencimentos brutos dos 260 magistrados, incluindo desembargadores da ativa (140), aposentados e convocados para atuar temporariamente na Corte (120), custaram R$ 252,5 milhões entre janeiro e novembro – os valores de dezembro ainda não foram disponibilizados pelo Portal da Transparência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
O TJ de Minas Gerais é o segundo maior do País, com 27.334 servidores. Fica atrás apenas de São Paulo, conforme dados do CNJ.
Em agosto, quando parcelas significativas foram depositadas a título de “direitos eventuais”, 95 magistrados receberam mais de R$ 300 mil brutos cada. O segundo mês com maiores holerites foi abril, quando 176 desembargadores ganharam acima de R$ 200 mil brutos. Em todos os 11 meses com dados disponíveis, houve holerites superiores a R$ 79 mil brutos – o dobro do teto.
Percebam que nem a Reforma Trabalhista, um arremedo de trabalho arquitetado para prejudicar trabalhadores apenas da iniciativa privada e a Reforma Previdenciária que nem de longe acabou com essa desigualdade monstruosa que habita o Poder Judiciário, quando promulgadas, aventavam justamente a possibilidade de acabar com marajás e outras aberrações.
Não há justificativas plausíveis para as aberrações contidas nos contracheques do alto escalão do Poder Judiciário brasileiro. São muitas as vantagens que nenhum outro servidor ou trabalhador do setor privado possam sonhar um dia em receberem. Além do mais, eles deixam de receber férias e licença prêmio durante a carreira ou por um tempo determinado, para depois receberem a mega sena quando se aposentam.
Os famosos auxílios ou penduricalhos são limitados pela Constituição no holerite do funcionalismo público ao que recebe um ministro do Supremo, mas magistrados recebem auxílios que não entram no cálculo. São verbas indenizatórias (como auxílios para transporte, alimentação, moradia e saúde) e vantagens eventuais (como 13º salário, reembolso por férias atrasadas e serviços extraordinários prestados) contadas fora do teto, abrindo caminho para os chamados “supersalários”.
Levantamento do Centro de Liderança Pública mostrou que o Brasil poderia economizar R$ 2,6 bilhões por ano cortando valores recebidos acima do teto constitucional. Mas o teto não é feito para eles, e sim, para “punir” apenas os servidores comuns que não tem como fugir do redutor salarial imposto pela lei e CF.
Para o secretário-geral da ONG Contas Abertas, Gil Castello Branco, os “privilégios” do Judiciário são “praticamente intocáveis”. Especialista no monitoramento de gastos públicos, ele considera as férias de 60 dias e o direito de venda do período de descanso como os direitos mais “problemáticos”, porque funcionam, na prática, como uma “complementação salarial”. “Uma reforma administrativa justa deveria reduzir privilégios não só no Executivo, mas no Legislativo e no Judiciário, a começar pelos supersalários”, afirmou Castello Branco.
Isso mostra que o Brasil não precisa de reformas, mas sim, de ética, honestidade e muitas reestruturações no sentido de que sejam cumpridas as leis e a Constituição Federal. Não podemos conviver com tanta desigualdade entre o sistema público/privado. Não é possível que militares e desembargadores, além de políticos, possam receber tanto recurso nos seus vencimentos em detrimento de milhões sem emprego e sem alimento nos pratos.

* Escritor, Blogger, Analista Político e Graduado em Gestão Pública.