Ana Maria Coelho Carvalho*

Fiquei encantada com a vaca Indiana Canvas 2R, de Uberlândia, que certa vez foi destaque na mídia como recordista mundial na produção de leite. É uma vaca de elite, simpática, da raça Girolando, branca com grandes manchas pretas, com tetas enormes e ubre gigantesco. Foi campeã de torneio leiteiro, produzindo 115,20 kg de leite num único dia, um exagero (leite suficiente para alimentar um bezerro por uns 30 dias, eu acho). Ela é tratada como rainha: toma três banhos por dia, tem veterinário, nutricionista e três pessoas que cuidam dela o dia todo, a um custo de oito mil por mês. Mas o retorno financeiro é certo, com a venda de crias e embriões.

Pensando na Indiana, famosa e rentável, lembrei-me de outra vaca, também branca e preta e da mesma raça. Desconhecida e simples, mas uma mãe extremada. E brava, muito brava. Tive contato com ela, num encontro breve e inesquecível, há algum tempo atrás.

Esse encontro aconteceu na fazenda de um amigo, nas proximidades da cidade. Fomos, em turma, fazer um churrasco em família. Enquanto pais, mães, tias e amigos comiam e bebiam, tive a genial ideia de levar a criançada ao curral para passar a mão nos bezerrinhos. Éramos eu e mais sete crianças, com idade de dois a 11 anos. Passamos pela porteira que dava para o pasto, andamos um pouco e nos aproximamos do curral. Nisso, eu vi uma vaca, que estava solta no pasto, trotando rápido na nossa direção e bufando furiosa. Escavava o chão com os cascos, sacudia as tetas na corrida e estava pronta para nos chifrar. Apenas gritei: -“Gente, a vaca!” A meninada debandou rápido em direção a uma cerca de arame que existia nas proximidades. As duas menininhas de três anos endureceram e tive de arrastá-las. Quando chegamos até à cerca, as duas entalaram no arame (ainda bem que era liso, não era farpado). Algumas crianças conseguiram se empoleirar no alto e um deles, pequenino e esperto, passou por baixo da cerca. A turma toda gritava a plenos pulmões:- “Socorro, alguém ajude”, mas ninguém escutava. E a vaca vindo, cada vez mais perto.

Tudo isso aconteceu em segundos. Num ato heroico, com as pernas trêmulas, dei as costas para a vaca, para proteger as crianças (fazer o que). Fiquei paralisada, esperando a chifrada ou cabeçada, pois, na verdade, na confusão e desespero, nem sei se a vaca tinha chifre. Mais alguns segundos e nada. Criei coragem e olhei para trás. Milagre! Fomos salvos pelo amor de mãe, um amor que salva vidas. A vaca, na sua corrida desenfreada, passou perto do curral, que estava entre o pasto e a turma encurralada. A mãe amorosa viu seu bezerrinho, parou a corrida e se aproximou para protegê-lo de nós, os intrusos. Alívio geral.

Como esse, existem muitos casos interessantes envolvendo sentimentos de proteção demonstrados por animais. Como o caso de Karina Chikitova, uma menina de três anos, que ficou perdida durante onze dias em uma floresta da Sibéria. Ela saiu de casa com seu cachorro e se perdeu em um local habitado por ursos. Sobreviveu comendo frutas e bebendo água do rio. Depois de nove dias, o cachorro voltou para casa e guiou equipes de resgate até o local onde a criança estava. Incrível esse exemplo de comportamento animal!

Enfim, aprendi uma lição: nunca, mas nunca mesmo, se deve passar a mão em bezerrinhos recém nascidos, por mais cativantes e fofinhos que eles sejam, se a mãe, a vaca, estiver por perto. Mesmo se o bezerrinho for de vacas famosas e de elite como a Indiana.

*Bióloga – Uberlândia – MG – anacoelhocarvalho@terra.com.br