Antônio Pereira*

Para mim, um divisor de águas. O primeiro espaço construído na cidade com características típicas de um teatro foi o Rondon Pacheco, embora não tenha sido criado com esse objetivo. Era para ser, e foi, um espaço destinado às solenidades e festas do Grupo Escolar, hoje Escola Estadual Bueno Brandão.
Se foi um divisor de águas, é porque havia um teatro diferente antes dele. Não havia nenhum prédio que se pudesse dizer que fosse um teatro. Havia os cineteatros. Casas construídas para serem cinemas e eventualmente teatros. Certamente não atendiam todas as exigências do palco. Havia os salões de clubes sociais, os salões de instituições profissionais, os salões de escolas. E havia o problema do preconceito, coisa muito em moda na cidade. O sucesso estava garantido, para qualquer espetáculo, de qualquer qualidade, se fosse apresentado no Uberlândia Clube. O espectador ia lá, não para assistir um espetáculo, mas para estar no Uberlândia Clube.
Teatro sempre existiu na cidade. Desde os seus princípios. Honório Guimarães, José Teixeira de Santana, Salazar Moscoso e outros eram promotores de espetáculos teatrais, além das trupes que passavam por aqui. No correr dos tempos, tivemos alguns grupos interessantes como o do Adalberto Pajuaba, o dos França, que lançaram o “Isto é Uberlândia”, até hoje citado, como grande sucesso. Dele saiu o Hino do Município.
O teatro Rondon Pacheco foi construído nos anos 960. Eu era Secretário Municipal de Ação Social que, à época, incluía Cultura, Educação, Saúde e Ação Social propriamente dita. Um dia, fui visitar a obra (que era do Estado) e percebi que se cometia um erro grave: o palco era cimentado. Falei com o engenheiro que não me deu muita atenção e concluiu a obra com o erro. Tempos depois fizeram a correção. Subiram o palco para que se criasse um porão entre o palco e o piso de cimento. Para isso foi necessário reduzir o espaço da plateia porque o palco ficou bem mais alto do que era e avançou sobre ela. As primeiras fileiras não viam o que se passava no palco ou viam só a metade.
No começo, a casa era usada para as finalidades escolares, mas começou a chamar a atenção dos grupos que se formavam e um deles, o Cinterartes, tanto insistiu que conseguiu apresentar o primeiro espetáculo teatral no Rondon Pacheco: a Casa de Bernarda Alba, de Garcia Lorca. Em 1977. Foi sucesso.
Nesses anos, 960, 970, 980 e mais outros, ocorreram fatos importantes para a história do teatro: primeiro, a construção do Rondon Pacheco, depois, o desenvolvimento de grupos jovens (os grupos de antes do Rondon eram de gente madura), a decadência do Uberlândia Clube, a criação da Secretaria de Cultura pelo prefeito Zaire Rezende, o início de uma vida universitária intensa.
A Secretaria de Cultura foi entregue à professora Yolanda de Freitas que deu impulso ao desenvolvimento da cultura artística local principalmente a popular. Impôs respeito às manifestações das instituições negras, das religiosas, das folclóricas. Estimulou todas as manifestações culturais e transformou o Cine Teatro Vera Cruz em espaço teatral apenas com o nome mudado para Teatro Grande Otelo. Apesar de limitado pelo preconceito, foi um reforço ao estímulo que o Rondon Pacheco deu ao teatro. A Universidade trouxe diretores e técnicos de alta capacidade para trabalharem a arte da representação.
A Associação do Teatro de Uberlândia- ATU pressionou para que o Estado cedesse o teatro para a Prefeitura. Foi em 1983.
Com o passar do tempo a sala entrou em decadência. Além de condições que se deterioravam, o Corpo de Bombeiros não permitiu seu uso com apenas uma saída. Era finais de 2016. Por fim, o Estado não renovou o contrato de comodato que cedia o Teatro para o uso da Secretaria de Cultura.
Hoje é um templo esquecido.

*Jornalista e escritor – Uberlândia – MG