Ana Maria Coelho Carvalho*
Há tempos atrás, estava eu na esquina conversando com uma amiga. Aproximou-se um senhor baixinho e simpático, perguntando se sabíamos onde era uma flora ali por perto. Contou que veio de ônibus de um bairro distante e tinha esquecido o endereço, mas sabia que era por ali. Respondemos que devia estar enganado, não havia flora nas redondezas. Ele saiu resmungando e foi pegar o ônibus de volta.
Minha amiga comentou que também era muito esquecida. Naquela mesma semana, havia visitado a irmã no hospital e na volta, não encontrou o seu carro. Procurou-o na vizinhança e concluiu que o tinham roubado ou a Setran o tinha guinchado. Desconsolada, voltava a pé quando, de repente, avistou seu carro, estacionado em uma rua onde nunca pensaria em procurá-lo. Ela o estacionou lá e esqueceu!
Aproveitando, contei também o meu caso de esquecimento daquela semana. Numa tarde, fui à padaria com a Mel, minha cachorrinha yorkshire, e amarrei-a na grade ao lado da padaria. Fiz as compras e voltei. Às 20:30h, chamei a Mel para comer sua ração e ela não apareceu. De repente, como se um raio caísse na minha cabeça, lembrei-me: eu a esquecera amarrada na padaria! Sai esbaforida e não a encontrei, alguém a tinha levado! Perguntei na padaria e ninguém sabia de nada. Fiquei com sentimento de culpa (lógico), tristeza, remorso, desespero. Andei por vários quarteirões perguntando e colocando cartazes de “Procura-se”. Eu e o filho entramos no facebook e nos sites de associações protetoras dos animais, mandamos a foto da Mel e pedido da ajuda, pois uma vez ela sumiu e foi encontrada assim. No dia seguinte, fui á padaria ver se havia notícias. Conversei com o dono , o Beto (nome fictício, para proteger o personagem) e ele contou-me que na padaria havia um sistema de câmeras. Fomos assistir ao vídeo e por sorte, a Mel estava em um ótimo lugar para ser filmada (ao menos isto, coitadinha). Às 16:30h, lá estou eu no vídeo, com minha sacola de pano, amarrando a Mel. Às 16:40h, saio da padaria com a sacola cheia e passo direto pela Mel, nem olho para o lado. A partir daí, ela deita, levanta, põe a língua para fora, espreguiça, abana o rabinho, coça, late, coça novamente, tudo registrado minuto a minuto. Eu olhando agoniada e o Beto conhecendo e falando o nome de todas as pessoas que entram na padaria. Às 17:30h , ela ainda continua amarrada na grade. Às 17:40h também. Às 18h ela já desapareceu! Ele então volta o filme devagar e ficamos assistindo como se fosse um filme policial de mistério e de suspense. Uma mulher magra, morena, passa pra lá e pra cá, conversa com a Mel, olha para os lados. Falamos: foi ela. Não foi, a mulher desceu a rua e a Mel ficou. Às 17: 59h um homem alto, bem vestido, atravessa a rua , desata o nó e carrega a Mel para uma lojinha na frente da padaria. Alívio geral, ficamos sabendo onde ela estava. Fui correndo à lojinha, expliquei o acontecido, disse que vi tudo na câmera e pedi a Mel de volta. No outro dia, ela voltou cheirosa, de banho tomado e numa alegria indescritível.
Até hoje sinto remorsos, mas fico feliz de nunca ter esquecido ou perdido algum neto. E me consolo ao pensar que estes esquecimentos não acontecem só comigo. Como o senhor que perguntou-me onde era a rua Alexandre Marques. Eu respondi que essa eu não sabia, mas que a Eduardo Oliveira era a rua de cima. Ele riu e disse que era a Eduardo mesmo, tinha trocado os nomes. Pior foi o caso daquela americana, Dori Rhooades, que li no jornal. Ela vendeu uma jaqueta jeans usada e depois apareceu desesperada na TV, implorando para que o comprador entrasse em contato com ela. No bolso da jaqueta, por precaução, ela tinha escondido um par de brincos de brilhantes avaliado em 36 mil reais e esqueceu. Meu Deus, será onde vamos parar?
*Bióloga – Uberlândia – MG – anacoelhocarvalho@terra.com.br