Gustavo Hoffay*

A polêmica em torno da liberação da maconha para uso popular é muito grande e persiste há décadas, talvez séculos. Há profissionais da saúde e da justiça que aprovam e outros que desaprovam, outras pessoas são indiferentes e eu “não sou contra e nem a favor, muito antes pelo contrário” (como diria o paraminense Benedito Valadares). Certo é que durante muito tempo posicionei-me contra a liberação do uso da maconha em nosso país. Hoje, decorridos pouco mais de dez anos desde então e após descer mais a fundo nessa questão, recorrer a antigos alfarrábios, ouvir e acompanhar um considerável numero de ex-usuários em tratamento de sua dependência e originários de vários torrões brasileiros e, ainda, debruçar-me sobre abundantes pesquisas àquele respeito, refiz alguns conceitos que eu havia estabelecido para compor uma asserção pessoal e atrevi-me a dividir com o público algumas considerações que induziram posicionar-me na condição de neutro quanto a descriminalização daquela substância em nosso país, onde a repressão teve inicio nos anos trinta do século passado a partir do Rio de Janeiro e cuja Câmara Legislativa chegou a estipular multa e ordenar a prisão para quem fizesse uso do tal “pito do pango” ( muito comum entre os escravos); desde então a maconha vem causando terror e furor em uma considerável parcela da população brasileira. Desde a nossa mais tenra idade ouvimos de alguns dos nossos familiares e outras pessoas próximas, que a mexerica combate gripes e tem atividade antitumoral; que o alecrim trata doenças de pele e que o alho é muito usado para combater diarréias; a Erva-de-são-joão trata de estados depressivos leves a moderados, a aroeira tem propriedades anti-inflamatórias e que o capim-Cidreira é indicado no tratamento da diabetes, além de ter atuação ansiolítica. Contrarie-se especialmente alguns anciãos a esse respeito e prepare-se para ouvir algumas lições…! E a Cannabis? Essa ,por sua vez, também é cultivada em quase todo o mundo, tem mais de quatrocentas substâncias químicas em si mesma e sendo que uma delas, o tetraidrocanabinol, tem o poder de afastar pequenos insetos predadores por intoxicação ou seja: o que causa o “barato” nas pessoas é o mesmo que impede aquela planta de ser atacada por pequenos besouros, moscas, tesourinhas, vespas, formigas,ácaros e aranhas: enfim, uma auto-defesa daquele vegetal. Dependendo da pessoa que fizer uso da maconha ( pura, sem mistura), a mesma irá apresentar poderes medicinais: combate a dor, causa o sono e até mesmo leva o (a) usuário(a) a um transe místico, considerando-se aí a quantidade usada e a característica de cada pessoa. Esclerose múltipla, Parkinson, depressão, ansiedade e várias outras doenças e distúrbios também fazem parte de uma lista de doenças tratadas a partir da Cannabis. Interessante observar que os canabinóides inibem o surgimento de tumores e são usados por algumas pessoas que desejam ter aumentada a sua criatividade ( Carl Sagan, Alexandre Dumas, Stephen King e Gilberto Freire, são apenas alguns exemplos). Por aqui a maconha continua sendo proibida! O seu consumo inadequado e descontrolado pode provocar riscos e dada a sua capacidade de alterar a percepção de tempo e espaço, além de ser totalmente contra indicada para estudantes e trabalhadores por ser uma substância amotivacional. Observe-se que pesquisas da Organização Mundial da Saúde apontam que as drogas consideradas ilícitas matam 250 mil pessoas por ano, enquanto o álcool e o tabaco são responsáveis por pouco mais de sete milhões (!) de mortes no mesmo período. No Brasil já fala-se que o consumo de álcool mata mais que qualquer outra substância como a cocaína e o crack, porém é comum assistirmos menores sendo usados pelos seus próprios pais para comprarem bebidas alcoólicas em bares diversos e a qualquer hora do dia, desrespeitando a lei e não sabendo, eles, que o álcool pode provocar o surgimento de mais de duzentas doenças e de ser uma substância responsável por cerca de trinta por cento das internações hospitalares. É evidente que todos os apreciadores de álcool não sofrerão as deletérias conseqüências pelo consumo daquele líquido, preparado e apreciado desde sete mil anos antes de Cristo; mas é cientificamente comprovado que pelo menos doze por cento deles irá arcar com desagradáveis conseqüências e pelo fato de virem a tornar- se consumidores compulsivos daquela bebida, sobretudo se carregarem uma pré-disposição mórbida à dependência química e cuja realidade desconhecem. A maconha, enfim, é menos “viciante” e causa menos mal que o álcool. A propósito, em meus quase setenta anos de vida eu nunca ouvi dizer que alguém teve uma “over dose” de maconha, mas já estou cansado de ver e ouvir casos e fatos de pessoas assassinadas, ameaçadas, coagidas, aleijadas, doentes, estupradas e assaltadas em função do álcool, uma droga liberada e com poderes que ultrapassam até mesmo os nossos mais improváveis limites de imaginação, dada às suas diferentes intervenções na mente e no corpo de pessoas diversas. Libere-se a maconha e ter-se-á uma qualidade de vida melhor em comunidades que sentem-se ilusoriamente protegidas por traficantes e por todo um exército a eles subordinados – por eles treinado e aparelhado – não apenas nas grandes capitais mas também em diversas outras grandes cidades do interior brasileiro; um exército civil que tem na venda e distribuição da maconha uma de suas maiores fonte de renda e que não pensa duas vezes antes de usar de extrema violência para defender os seus negócios ilícitos. Grandes multinacionais canadenses e americanas do ramo farmacêutico e com representações no México,onde a maconha está legalizada desde março do ano passado, têm investido milhões de dólares naquele país com a finalidade de obterem grandes lucros a partir do uso terapêutico daquela erva e cujo mercado pode valer até cem bilhões de dólares já no ano de 2.030. Finalizo deixando para o (a) leitor(a) algumas observações para o seu discernimento: 1- liberada, aquela droga haveria de ter uma legislação específica para cada tipo de cannabis e incluindo-se locais de venda e quantidade máxima a ser vendida para cada usuário pré-cadastrado; 2- a marginalização da maconha causa mais mortes, sofrimento e destruição do que os seus efeitos sobre o cérebro dos usuários e 3- a descriminalização dessa erva diminuiria em muito o numero de pessoas presas e sentenciadas em virtude de suas ações no tráfico, distribuição e venda daquela erva, o que aliviaria a super lotação em cadeias e presídios de todo o Brasil. Tudo bem, entendo que seja difícil discernir a respeito de um assunto tão polêmico e com pontos a favor e outros contra. Adote-se, então, uma política liberal a esse respeito e permita-se o uso da droga dentro de parâmetros que permitam um controle estatal, desde que cada usuário e a sua família assumam toda a responsabilidade a partir desse ato. Assim, retiraria-se uma grande fatia do mercado da maconha das mãos dos narcotraficantes e em conseqüência diminuiria-se o elevado índice de criminalidade em função da disputa de pontos de vendas daquela droga. Uma determinada pessoa tornou-se usuária compulsiva? Seja então encaminhada a uma clínica de reabilitação e onde terá a toda a assistência terapêutica necessária para tornar a viver livre do uso de substâncias químicas psicoativas e da maneira de muitos alcoolistas que recorrem a esse tipo de tratamento. O que não pode continuar é o fomento de grandes quadrilhas e originado que é do comércio da maconha. No Rio de Janeiro, por exemplo, a quase quatro décadas o tráfico de drogas é dominado por facções criminosas nas favelas e sendo o Comendo Vermelho a principal delas. Saúde, segurança, lazer e educação fazem parte de uma política de assistencialismo praticada pelos criminosos naquelas áreas, com o intuito de poder exercer o poder sobre aproximadamente um milhão e duzentas mil pessoas e te-las como aliadas indiretas em seus negócios. Qual a polícia dá conta de deter esse exército e que justiça é capaz de enquadrar tanta gente, sob leis tão retrogradas quantas as que estão vigor? Quem de nós ainda não ouviu falar de Escadinha, Marcinho VP, Isaias do Borel, Rolinha e Elias Maluco? Até mesmo emissoras de TV faturam milhões com as drogas, ao glamorizarem o seu uso e o modus operandi dos seus principais atores em novelas e seriados de alta qualidade e de grande audiência junto à população mais vulnerável, os jovens! Liberar ou não a maconha? Deixar como está ou atrever-se a mudar o que aí está? E se o resultado de uma liberação for ainda mais danoso para a sociedade? A emancipação da maconha ao grau de droga lícita facilitaria a liberação de outras drogas? Difícil responder, não é? Então, senhores e senhoras, como já diziam os lusitanos “ durma-se com um barulho desse”!

Agente Social – Uberlândia-MG