Ana Maria Coelho Carvalho*
As gaivotas são aves marinhas que apresentam estrutura social altamente desenvolvida e comportamentos complexos. São capazes de detectar as correntes térmicas que se formam acima do mar e utilizá-las no voo. Usam o voo principalmente para encontrar alimento. Menos Fernão Capelo Gaivota.
A história desta gaivota está no livro “Fernão Capelo Gaivota”, de Richard Bach. É uma gaivota que foi banida do seu grupo por entender que voar era muito mais importante que comer. Enquanto o bando de mil gaivotas mergulhava na água em busca de comida, Fernão treinava seus voos razantes. Pairava no céu sozinho, longínquo, esfomeado, feliz, aprendendo. O seu tema era a velocidade. Batia as asas com força e lançava-se em vertiginosa descida em direção às ondas. Em seis segundos estava a 120 km/h, velocidade que desequilibra a asa no arranque para a subida. Quando tentava subir outra vez, o corpo girava como um parafuso e ele acabava como uma masssa de penas que se esmagava no mar. Tentou dar o mergulho a 600 m de altura e estabeleceu um recorde de velocidade para as gaivotas. Mas no instante em que modificou o ângulo das asas, esmagou-se num mar duro como tijolo. Quando voltou a si, jurou que seria uma gaivota normal e esqueceria aquela loucura do voo perfeito. Não haveria mais desafios nem fracassos. Se fosse destinado a voos rápidos, teria as asas curtas do falcão. Era isso, pensou, asas curtas!Tudo o que precisava era fechar as asas o mais que pudesse e voar só com as pontas. Voltou a voar e atingiu 320 km/h. A velocidade era poder, alegria e beleza pura. Sabia que qualquer falha o reduziria a fragmentos de gaivota. Fechou os olhos, passou pelas gaivotas do Bando de Alimentação como uma bala, fez a curva, espetou o bico para cima e foi reduzindo até conseguir abrir as asas. Na sua mente latejava o triunfo. Partiu para um mergulho a 2.400 m e descobriu que se movesse mais de uma pena, era disparado em um movimento giratório como uma bala de espingarda. E Fernão fez assim as primeiras acrobacias de uma gaivota viva. Quando se juntou ao bando, estava tonto, cansado e realizado. Pensou que as gaivotas ficariam loucas de alegria, pois agora haveria uma razão para viver. Mas não, ele foi banido do bando por sua desastrada irresponsabilidade e por violar a tradição das gaivotase esquecendo-se de que as gaivotas estão no mundo para comer e se manterem vivas. Gritou para o bando: “-Quem é mais responsável do que uma gaivota que descobre um significado, um propósito mais elevado para a vida? Agora temos uma razão para aprender, para descobrir, para sermos livres!” Todas as gaivotas lhe deram as costas. A partir daí, viveu solitário e aprendendo cada vez mais. Foi levado para o paraíso por duas gaivotas reluzentes que faziam experimentos de aeronáutica avançada. Aprendeu com a mais velha, Chiang, a se transportar para qualquer lugar do mundo apenas com a força do pensamento. Ficou preparado para voar para o além e conhecer o significado das palavras bondade e amor. Sentiu saudades do seu grupo da terra e voltou como uma gaivota brilhante que voava sem mexer uma pena. Passou a treinar o Francisco Gaivota, que fora expulso do bando porque queria alcançar a perfeição no voo. Começaram com o voo planado.
O livro é dedicado ao verdadeiro Fernão Capelo Gaivota que existe dentro de cada um de nós. Porque, na verdade, todos nós procuramos a liberdade, a perfeição, o amor, a bondade e o paraíso. Alguns poucos encontram, muitos outros não.
*Bióloga – Uberlândia – MG – anacoelhocarvalho@terra.com.br