Antônio Pereira da Silva*

O eleitor consciente dos nossos dias fica atordoado com a proliferação partidária, mas, se fosse votar nos princípios do século passado, se abismaria com o reverso extremo do partido único. Minas Gerais praticamente só tinha o Partido Republicano Mineiro que manipulava a seu bel prazer as eleições estaduais. Dizia-se nos meios políticos estaduais que “fora do PRM não há salvação…” – nem havia como.
Se, em nível estadual, tudo se resolvia nos conchavos da “Tarasca”, que era o apelido popular da Comissão Executiva do Partido, nos municípios a coisa se complicava um pouco porque havia a disputa de liderança entre os coronéis. Por consequência, no interior, o PRM se dividia em dois: o Partido Republicano Mineiro e o Partido Republicano Municipal, cujas siglas continuavam sendo a mesma: PRM.
A identificação ou diferenciação entre os PRMs interioranos se fazia pelos apelidos. Em Uberaba, por exemplo, o PRM se dividia em Pacholas e Araras. Em Uberabinha eram os Cocão e os Coió (*). Em Patrocínio eram Catimbaus e Mugangos.
Aqui, os Coió acompanhavam o entusiasmo do tenente coronel José Theóphilo Carneiro (que mais para o fim da vida se tornou Cocão), enquanto os Cocão estavam do lado do coronel Severiano Rodrigues da Cunha.
Esses líderes não tinham qualquer ideologia, o que lhes interessava era manter o poder que hipnotizava a arraia miúda do povão. O poder dava-lhes uma absurda imunidade e o privilégio de manipular nomeações e demissões de chefes dos serviços públicos. O gozo máximo do poder era transferir Delegado de Polícia.
Os Cocão eram do PR-Municipal. Os Coió eram do PR-Mineiro.
As eleições eram sempre tumultuadas e os resultados forjados. Aqui, em Uberabinha, as decisões dos pleitos vinham de Santa Maria onde votava a meninada do grupo escolar e os defuntos. Era comum o eleitor, ao dar o seu voto, justificar à Mesa:
– O cumpade fulano tá meio perrengue, pediu pr’eu votar pra ele. Taqui o tito dele.
O “cumpade” já tinha morrido há muitas eleições. E a Mesa deixava.
Os apelidos das facções do PR tinham origem em fatos pitorescos.
Em Uberabinha, os apelidos surgiram de um bate-boca entre o Agente Executivo (Prefeito) João Severiano Rodrigues da Cunha (Joanico) e o líder Marcos de Freitas Costa, o coronel Marquinhos, em plena praça da Prefeitura. Tentando ofender o adversário por sua baixa estatura (mas um dos maiores prefeitos que a cidade já teve), Marquinhos gritou-lhe:
– Você é um “cocão”!
“Cocão” é uma peça baixa que fica sob a mesa do carro de bois.
Joanico não se perdeu:
– E você é um “coió”!
“Coió” significava bobão.
O povo adotou esses apelidos mais fáceis de guardar – e de diferenciar PRM de PRM!
Alguns líderes “cocão”: Virgílio Rodrigues da Cunha, Chico Cotta Pacheco, Alexandre Ribeiro Guimarães, Constantino Rodrigues da Cunha, Adolfo Fonseca e Silva, Custódio da Costa Pereira, Joaquim Marques Povoa, Alexandre de Oliveira Marquez, Salvador Melazzo, Antônio Crescêncio, Joaquim Fonseca, Nicomedes Alves dos Santos, Carmo Giffoni, Antônio Calábria e outros.
Alguns “coió”: Olímpio de Freitas Costa, cel. Antônio Alves Pereira, Agenor Bino, Capitãozinho, Marcos de Freitas Costa, Amador Naves de Ávila, João Naves de Ávila, dr. Abelardo Penna, Fernando Vilela, Paes Leme, Rivalino Pereira, Guiomar de Freitas, Lycidio Paes e outros.
OBS: Esses nomes foram tirados da composição dos partidos nos fins da década de 1921, portanto, com vários líderes pioneiros falecidos e outros transferidos de partido, entre eles os Carneiro.
(*) – Não uso o plural porque o povo adotou o singular para estas duas palavras. Mesmo quando se referia a muita gente, dizia “cocão” ou “coió”. (Fontes: Honório Guimarães, Jerônimo Arantes e Hildebrando Pontes).

*Jornalista e escritor – Uberlândia – MG