Ana Maria Coelho Carvalho*

O Zé, meu marido, se foi. Morreu no dia de finados, um dia especial. Foi vítima de um câncer no pâncreas, que enfrentou com coragem e resignação, sem lamentações e sem desespero. Parecia feliz ao lado da família, sempre pedindo para alguém passar as mãos nas costas dele, era o que mais gostava. Enquanto ainda estava lúcido, disse que sabia que ia morrer e que deixava um abraço para todos da família e para todos os amigos. Dentre os tantos legados que deixou, este foi mais um deles, um exemplo de aceitação. Agora, temos que conviver com a sua ausência e com o vazio que ficou. Lembranças com o verbo no passado: a poltrona onde ele se sentava, a blusa verde escrita “Chamonix” que ele gostava, o jeito que falava “chegou a tiuurma” quando os netos barulhentos chegavam, os programas de TV que assistia, a xícara predileta onde tomava café. Nada mais é presente, tudo é passado. Deixou saudades e lágrimas.
De qualquer forma, a morte é uma coisa muito estranha. Assim, de repente, a vida acaba. A pessoa dá um último suspiro e pronto. Na missa de sétimo dia, na homilia, o celebrante alertou que precisamos estar preparados e que devemos fazer o bem enquanto estamos aqui na Terra. O Zé estava preparado. Depois de 51 anos de casados, deu o último suspiro no nosso lar e na nossa cama. Foi muito triste, mas fiquei com ele até o fim. No entanto, ele não vai ficar comigo, terei que aprender a caminhar sozinha. Já não estamos mais com os pés na mesma estrada e perdi uma pessoa que realmente me amava. E essa é minha dor. Sei que há dores bem maiores, mas a minha é essa. Lá se foi o Zé…Quando ele comprou a Fazenda Olhos D´Agua, depois de muitos anos economizando para isso, comentei com ele : “Que bom, você realizou o seu sonho!”. Ele respondeu :”Não, o meu sonho é você!” Dá vontade de chorar ao pensar nisso… Ele até pediu para ser cremado para depois eu também ser e juntarem nossas cinzas para ficarmos juntos por toda a eternidade. Também dá vontade de chorar, pois não quero ser cremada não… Lá se foi o meu personagem preferido. Meus leitores gostavam das histórias dele: o caso do prato de nhoque; a sola do sapato que perdeu no hotel de luxo; o tênis que comprou e esqueceu; a camisa da mulher pelada; o prejuízo com a criação das galinhas e muitas outras. Lá se foi uma pessoa que fazia amizade com todos e que fez história por onde passou: na UFU, no Cajubá, na ASUFUB, no XV de Novembro. Recebeu muitas homenagens em vida e depois de sua morte também. Ele realmente fez valer a pena cada minuto que viveu aqui na Terra. Lá se foi uma pessoa simples, de bom coração, de boa convivência e que gostava de colocar apelidos carinhosos nas pessoas. O netinho careca era o Kojak; o outro que corria sem parar era o Ligeirinho; o amigo do meu filho era o Amizade; o sobrinho corredor era o Fitti; o menino da fazenda que andava no boi era o Peãozinho; a amiga das filhas que adorava desfilar era a Number One. E no final da vida, como eu cuidava dele, me chamava de Mão Amiga. Lá se foi um bom pai e os seis filhos sempre souberam disso. Na doença, foi emocionante o carinho deles com o pai, sem palavras para agradecer. Momentos de conversas gostosas, de massagens nos pés, de palavras de consolo, de segurar nas mãos nos momentos finais, de orações em conjunto, de agradecimento por tudo.

Enfim, ele está agora descansando ao lado do Criador. Fica o consolo do legado de bondade e de bons exemplos que ele deixou e de tanto carinho recebido dos familiares e amigos. Dentre as muitas mensagens bonitas que recebi, há uma que diz: “a lágrima mais bonita é a da saudade, pois ela nasce dos risos que já se foram, dos sonhos que não se acabam e das lembranças que jamais se apagam”. É assim mesmo, as lembranças ficam e parece que as pessoas que amamos partem para dentro de nós, não partem para longe. Outra que gostei tem o desenho de duas mãos entrelaçadas, uma mão de carne e osso e outra transparente, feita de luz, com os dizeres: “neste dia não olhe para a morte , para o vazio, a dor e a saudade; celebre a vida, a alegria do que foi possível e o que de bom foi vivido com aquele que partiu”. Assim, agradeço a Deus por ele ter vivido e por tudo de bom que passamos e realizamos juntos. E tentarei seguir pela vida de mãos dadas com o Zé pelo tempo que me resta.

*Bióloga – Uberlândia – MG – anacoelhocarvalho@terra.com.br