Ivan Santos*

Por aqui, depois do Corona, muita coisa mudou. Depois de mais de 15 dias sem a tradicional Feira de Rua, aos sábados, as bancas dos feirantes voltaram a funcionar no fim da semana passada. Só menos da metade delas. Fui. Encontrei o ambiente diferente. As poucas bancas de verduras que apareceram, eram operadas por novatos. Os velhos feirantes ficaram em casa confinados. Compareceram filhos, netos, genros ou amigos. Todos mascarados e sem treinamento para aquele tipo de comercio.
Cada novo feirante, com um telemóvel na mão ficava todo o tempo a ver ou a ler não sei o quê. As verduras e frutas foram expostas sem seleção prévia. Quem, como eu, prefere produtos de melhor qualidade, teve que catar uma e outra fruta no meio de muitas. Os novos feirantes não prestam atenção nos clientes. Preferem olhar para o celular e voltam o troco, geralmente errado, a favor ou contra eles. Alguns, mais previdentes, recebem o dinheiro, pegam uma calculadora e só depois de uma operação digital olham para o resultado e voltam o troco sem conversar com o cliente. Todos fleugmáticos, plugados num telemóvel.
Não ouvi um diálogo sequer entre compradores e vendedores. Diferente do que sempre vi na Feira. Também os tradicionais clientes não compareceram. No lugar deles, muita gente nova. A tradicional banca do pastel, que vendia um produto saboroso, não apareceu. Também não vi a dupla caipira que cantava e vendia CDs com as próprias composições musicais. A feira de sábado passado estava sisuda, triste, muda. Percebi que o velho mundo que eu conhecia começou a desabar. As velhas tradições como a Feira de Rua por aqui estão a mudar para se adaptarem ao novo mundo que surgirá depois do Corona.
Na rua da Feira quase não vi gente minha conhecida. Apenas encontrei uma tradicional feirante, dona de uma banca de verduras muito movimentada onde eu me abastecia para passar a semana com alface, couve e legumes frescos. Na rua, ela me deu uma lista impressa com indicação de produtos e preços e me passou um recado: “Agora só vou atender pela Internet. Você pode ligar neste número do Zap, escolher as verduras e frutas que quiser e eu mando na sua casa todos os sábados e quartas-feiras. Na rua não vou voltar mais”.
Percebi que sou, hoje, uma carta fora do baralho da realidade social. Ou me adapto a ela ou vou perecer antes do tempo natural. O mundo que conheci está no fim. O Corona acabou com ele. Meu mundo era analógico. O mundo que vejo à minha frente, é digital. Quando chegar a tecnologia 5-G no Brasil, muita gente vai disputar espaços vitais com robôs. Teremos maquinas inteligentes trabalhando e pessoas humanas plugadas, todos os dias, num telemóvel para curtir emoções espalhadas por fakes news. Vai ser diferente. Muito diferente de tudo o que conheci. Mundo Novo, para os raros. Os digitalizados.

*Jornalista