Marília Alves Cunha*

Este é o título do livro de Alberto Villas, escritor e jornalista mineiro que faz um bem humorado inventário de “personagens, hábitos, produtos, nomes, marcas e objetos que se eternizaram em nossa memória como ícones de uma época”. Ganhei este livro há muitos e muitos anos e hoje, relendo, acho uma graça imensa da quantidade de coisas que foram perdendo espaço para a modernidade e que despertam lembranças, não apenas do que se perdeu, mas de acontecimentos relacionados a elas.
Quem ainda faz o tal de “arroz de forno”? Na minha casa, em tempos de outrora, era um prato sempre presente nos almoços domingueiros, acompanhando o frango assado e a tal de macarronada. Era muito gostoso, servido fervendo, soltando fumaça. Tenho a impressão que se juntavam sobras da semana para incrementar o tal do arroz. Sei não… O “frango vivo” era comprado na feira, depois de escolhido o mais gordinho entre vários, pendurados num cabo de vassoura, de cabeça para baixo. Morria de dó… E da “nata do leite” bem lavada e bem batida, resultava uma manteiga de primeira, in natura, apreciada por todos. Leite gordo trazido pelo leiteiro todos os dias, anunciando sua chegada com uma potente buzina. “Bolachas Piraquê” – alguns vão se lembrar. Eram embaladas numa bonita lata e tinham o formato de bichinhos variados. A criançada adorava.
Muita gente já quebrou um dente com a “pedra no feijão”. Era serviço rotineiro nas cozinhas o catar estas pedras para que malefícios não fizessem a ninguém. E o “papel almaço”, aquela folha grande, pautada e com uma fina margem vermelha? Os trabalhos da escola e provas eram feitos nestas folhas, muito antigamente. Quando fiz o Curso de Direito, já mais velha e completamente ignorante em matéria de tecnologia, apresentei ao professor de Direito Comercial um trabalho feito á mão, numa destas folhas que nem sei de onde saiu. O professor, um rapaz bem novinho, olhou detidamente o trabalho, espantou-se e admirou-se com a obra de artesanato da época jurássica e o meu trabalho transformou-se no assunto da aula… Morrí de vergonha e tratei de correr para uma escola de informática.
E as fotos? Houve uma época em que os “monóculos” causaram furor. Era horrível enxergar as fotos bem pequeninas, no fundo daquelas armações de plástico. Foi uma moda que durou pouco, graças. Mas era bem mais difícil conseguir uma foto antigamente, quando tudo dependia de outras pessoas, tinha de ser revelada e tirada de negativos. Hoje em dia o mundo abunda em selfies de tudo quanto é jeito, o narcisismo tomando conta principalmente dos jovens…
Toda família que se prezasse tinha um quadro da “Santa Ceia” na parede da Copa. Prateada e em alto relevo. Fiquei com uma, herança de família e nunca arranjo um lugar para colocar a bendita, assim como não tenho como me desvencilhar de um velho “missal” que ganhei aos 15 anos. Hoje em dia ninguém reza a missa pelo missal…
Nos cinemas havia o “lanterninha”, um senhor que acendia a lanterna e ia nos indicando o caminho. Para ser franca, acho que ele servia mais para vigiar os namorados que, no escurinho do cinema, se aproveitavam para longos beijos e amassos… Em Araguari, o senhor Antônio da Nina cumpria com determinação o papel de controlar casaizinhos sôfregos.
E aquela “vitrola” simples, que a gente apenas ligava, desligava e punha a agulha para deslizar no preto do vinil. Tudo manual. O “disco de vinil” vinha dentro de uma capa, envolto em plástico. Era como um ritual: esperar ansiosamente o dia de comprar o disco na loja e, chegando em casa, colocá-lo para tocar. No fim, limpá-lo cuidadosamente com uma flanelinha seca, cuidadosamente. Hoje em dia não ouço mais tanta música como há tempos atrás. Parece que ficou muito fácil e, sendo assim, você deixa para outra hora. Falta o ritual…
Quando meu sogro comprou o “Simca Chambord” foi uma festa. O carro ficou na porta da casa (que não tinha garagem)… Araguari em peso veio ver o carrão, de duas cores e brilhosos adereços. Meu saudoso e querido sogro passou o resto do dia passeando com a família e vizinhos no vistoso automóvel. Acho que ninguém mais fala automóvel… Sinto falta dos remédios e de sua eficácia.” Enteroviofórmio” curava qualquer dor de barriga, da mais virulenta à mais singela. O “Anti-cárie Xavier” é o responsável por bons dentes de muita gente e era obrigatório, assim como a Emulsão de Scott (porreta para o crescimento) e “Óleo de Fígado de Bacalhau” que hoje, mais chic, transformou-se em Ômega 3…
Para as crianças o mistério grande era saber “de onde vêm os bebês”… Tinha história de cegonha, de repolho, de uma tal de sementinha que os pais plantavam na barriga das mães… O autor do “O mundo acabou” conta que um dia quis ser moderno e comprou para os filhos o livro chamado “De onde vêm os bebês?”. O livro explicava que o orgasmo era como se alguém pegasse uma pena e passasse no nosso nariz. Um dia, quando a filha perguntou o que era “transar” o irmão mais novo se arvorou a responder: “ Primeiro, você pega uma pena…” Pior foi quando a filha bem pequena de uma amiga perguntou a ela de sopetão:” Mamãe, o que é tesão?” – E ela, pega de surpresa respondeu: “ É um T grande, minha filha!” E lembro-me perfeitamente da resposta dada a mim, quando perguntei da barriga grande de uma conhecida de meus pais que crescia a cada dia e obtive a resposta: “Barriga dágua!” E a gente acreditava…
Um mundo acabando e outro chegando no lugar, com muitas inovações, muita modernidade, muita diferença daquele da minha infância. Mas entre tantas objetos, costumes e modismos que desapareceram, sinto que algumas coisas estão mesmo sumindo do mapa hoje em dia, algumas coisas importantes que deveriam ser para sempre: honestidade, amor ao próximo, justiça, sendo substituídos por esperteza, egoísmo e impunidade. Triste fim!
Bom demais reler este livro e recordar coisas do passado que marcaram a vida de muita gente.

*Educadora e professora