Gustavo Hoffay*

um deles eu tive a grata satisfação de conhecer durante o tempo em que fiz parte da diretoria do Conselho Municipal de Entorpecentes-COMEN (hoje Conselho Municipal Antidrogas-COMAD), o outro eu conheci na Catedral Santa Terezinha e também já há alguns anos. Acredito que desde aqueles tempos eles já formavam uma dupla que esperava obter solução para os moradores de rua e unicamente pela aplicação da caridade, de doarem-se em prol de pessoas que buscam um sentido para as suas vidas, que passam as noites dormindo sob marquises, em bancos de praças e sob pontes e viadutos ou ocupando casas em extrema situação de miséria, quando não em interiores de carcaças de carros abandonados em meio às ruas. Ditão e Jack, duas almas especialmente tocadas pela mão divina, que sentiram o total estado de carência física e espiritual daquelas pessoas e que, enfim, resolveram agir para buscar uma solução ao menos paliativa para uma situação que tocava-lhes os mais profundos sentimentos de caridade para com o próximo, são dignos de toda a consideração e respeito pela sociedade uberlandense e quanto mais agora quando, finalmente e depois de uma missão que abraçaram com espontâneo desejo, deram vida ao sonho de construir uma nova e ampla casa de acolhimento e inclusive para imigrantes sem mão de obra qualificada, que chegam diariamente de regiões diversas a Uberlândia na esperança de obter empregos propagados por uma mídia que realça o crescente desenvolvimento desta metrópole, na busca de uma melhoria de vida, novos “candangos” em busca de sua realização pessoal. Alguns, infelizmente, não têm a sorte de fixarem-se profissionalmente nesta urbis do cerrado e talvez por falta de uma mão de obra especializada ou por motivos outros que não cabem aqui ser comentados, terminam isolados e à margem da comunidade produtiva; outros, até, escolhem viver nas ruas e longe de disciplinas impostas por grupos que desejam ajudá-las, orientá-las, encaminhando-as em direção a um novo, nobre e produtivo modo de vida.Mas diante de tudo isso e revolvendo minhas pessoais memórias e experiências no trato de dependentes químicos por mais de duas décadas, as vezes pego-me pensando se problemas dessa ordem podem ser resolvidos apenas pelo amor ou até que ponto o amor será a solução? A justiça deveria resumir-se unicamente à distribuição de direitos e deveres da sociedade? Seria uma casa de acolhimento, motivo de humilhação para quem delas se serve? Pessoalmente prefiro uma definição intermediária entre justiça e caridade, a qual dá-se o nome de justiça social e na forma que nenhum órgão governamental consegue de fato tornar real pois, na maioria das vezes, falta o que conhece-se por amor-ágape em suas ações. Entendo que ninguém cometeria o contra-senso de imaginar que as entidades oficiais de ordem social, entendidas no restrito conceito de assistência paternalista possam, algum dia, ser uma solução definitiva; isso seria uma mera questão de demonstração de força sobre os fracos. Ora! A caridade posta em prática pelos administradores da Casa Gemma e de todos os seus voluntários vai muito além do que entende-se por justiça. Lá há amor puro, amor fiel, muito mais leal, pois ali sente-se a gratidão de infelizes que tiveram, por alguma razão, os seus sonhos por uma vida melhor inteiramente mutilados. O auxilio verdadeiramente cristão é dado por quem é igual em sentimentos àquele que deseja ser auxiliado e que não pede o aplauso de entidades oficiais; a justiça oferecida pela Casa Santa Gemma e também por outras instituições que acolhem e dão sentido à vida de outras centenas de milhares de pessoas, oferece aos necessitados o que lhes é devido por justiça e visando proteger os direitos de cada um. Morar ao relento, em ruas e praças, é algo inimaginável e se pensarmos o quanto a violência ( em todos os seus matizes), a falta de saneamento básico, higiene e alimentação dignas são ali cruéis e constantes. Fomentar a criação de cooperativas de pessoas em situação de rua e onde elas possam viver da sua produção ( a exemplo do que, em parte, ocorre em cooperativas de catadores de produtos descartados recicláveis), criação de hortas e viveiros comunitários, criação de oficinas sobre jardinagem, pintura de obras, eletricidade e manutenção de prédios seriam, por exemplo, uma forma de oportunizar a formação de mão-de-obra em uma metrópole que gaba-se da sua pujança no setor da construção civil. Havemos de convir que a verdadeira ajuda a essa classe de pessoas deve sempre levar em consideração a justiça, uma misericórdia que exige e ao contrário de simplesmente oferecer-se esmola, um mísero paliativo de conseqüências muitas vezes desagradáveis para quem recebe, pois termina privando uma pessoa produtiva de um salário a que teria direito. Interessante observar que a Casa Gemma, também, termina por estabelecer relações da comunidade com os indivíduos ali albergados e o que concorre em muito para o bem comum. Meus efusivos porém muito humildes parabéns ao Jack e ao Ditão e que essa sua obra possa servir de modelo a tantas outras nesse sentido e por toda a região do Triangulo Mineiro.

*Presidente do Conselho Deliberativo Fundação Frei Antonino Puglisi
Uberlândia-MG