Cesar Vanucci*

“… Mas eu só queria passar!”
(Sheilla Lobato, escritora, no poema “Lamento de um rio”)

Faço esporádicas incursões pelo fascinante e desgastante território da internet. Procuro, precavidamente, nessas andanças, evitar os trechos minados, muito mais abundantes do que poderia supor nossa vã filosofia… Na faixa chafurdenta do território percorrido pelas multidões, zilhões de vezes, todos os dias, em todas as partes deste confuso planeta azul, vicejam, como sabido, irritantes frivolidades, atordoantes intrigas, perversas maledicências, inimagináveis falsidades. Tudo isso gerado, como também notório, por legiões de indivíduos despojados de sensibilidade social e sentimento do mundo. Ao lado dos assim (apropriadamente) chamados “idiotas da aldeia”, a coadjuvá-los eficientemente na massiva tarefa de ilaquear a boa fé das pessoas e levar o desassossego às mentes e corações, sobretudo nas camadas mais ingênuas da sociedade, colocam-se, galharda e pressurosamente, analfabetos políticos. E, ainda, anarquistas de todos os naipes, profissionais especializados em espalhar falsidades e vociferações preconceituosas. Todos a soldo de personagens e grupos maquiavélicos inebriados pelos ouropéis do poder mundano.

Nas buscas empreendidas nessas ocasionais ações como internauta, apego-me sempre a um lema: as amargas, não. A procura pessoal a que me atino, impelido pela esperança, é de lances de vida que enriqueçam a alma, fortaleçam a causa da construção humana. Esse lema remete-me a nostálgica lembrança. Falo da leitura, nos idos tempos da adolescência, de interessante livro, justamente com o título “As amargas, não”, do festejado escritor Álvaro Moreyra.

Isto posto, peço permissão, agora, ao distinto e culto leitorado que acompanha estas maltraçadas linhas, produzidas dia sim, dia não, por este desajeitado escriba, incorrigível caçador de quimeras, para aqui reproduzir, compartilhando-os prazerosamente, sugestivos e emblemáticos versos. Recolhi-os em incursão recente a áreas da internet onde sentimentos nobres, propósitos edificantes, conceitos de vida positivos costumam, afortunadamente, jorrar em compensadora profusão. São versos de Sheilla Lobato no poema intitulado “Lamento de um rio”. Narram, com envolvente lirismo, uma história de candente atualidade.

“Me perdoem por toda esta “bagunça”… Eu só queria passar. / Eu não fui feito pra Destruir… Eu só queria passar. / Já fui Esperança para os Navegantes… / Rede cheia para Pescadores… / Refresco para os banhistas em dias de intenso calor. / Hoje sou sinônimo de Medo e Dor… / Mas, eu só queria passar…// Me perdoem por suas casas / Por seus móveis e imóveis / Por seus animais/ Por suas plantações… Eu só queria passar. / Não sou seu inimigo / Não sou um vilão / Não nasci pra destruição… / Eu só queria passar. // Era o meu curso natural / Só estava seguindo meu destino / Mas, me violentaram, / Sufocaram minhas nascentes / Desmataram meu leito… Quando eu só queria passar. / Encontrei tanta coisa estranha pelo caminho… Que me fizeram Transbordar…/ Muros / Casas / Entulhos / Garrafas / Lixo / Pontes / Pedras / Paus…/ Tentei desviar … Porque eu só queria passar. // Me perdoem por inundar sua história, / Me perdoem por manchar esta história… / Eu só estava passando… / Seguindo o meu trajeto / Cumprindo o meu destino: / Passar…. //

* Jornalista, presidente da Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais (cantonius1@yahoo.com.br)