João Batista Domingues Filho*
Choque permanente entre o modo de produção capitalista e a democracia: poder do voto versus o poder do capital, cuja sobrevivência do capitalismo contemporâneo não depende da democracia. No Brasil, as maiores ameaças à economia brasileira são produzidas internamente, colocando em risco a reprodução capitalista do capital, por corrosão das instituições econômicas inclusivas. O Brasil não tem êxito econômico, nem prosperidade por falta de solução de seus problemas básicos para o desenvolvimento de suas instituições democráticas de combate às desigualdades, segundo Acemoglu, Daron e James A. Robinson no livro “Por que as Nações fracassam.”
Entre 1945 e 1975, Europa viveu trinta anos gloriosos: crescimento econômico em ritmo acelerado, construindo sociedades de classe média com igualdade, empregos, seguranças para a maioria dos cidadãos. É o capitalismo “Social-Democrático” desenvolvido. O Brasil, nesse mesmo período, sofria as tentativas malsucedidas de golpes militares das Forças Armadas: 1945, 1954, 1955 e 1961. Ditadura militar de sucesso se deu com cinco generais do Exército se alternando no comando do Executivo: Castelo Branco (1964-7); Costa e Silva (1967-9); Garrastazu Médici (1969-74); Ernesto Geisel (1974-9); e João Figueiredo (1979-85). Governação militar com 21 anos de ditadura, sem entregar as gloriosas conquistas socialdemocráticas dos países ricos europeus, segundo artigo de Heloisa M. Starling: “O Passado que Não Passou”, no livro “Democracia em Risco.”
Cenário mundial de hoje: redução do Estado Intervencionista e predominância do mercado como mecanismo de alocação do capital na sociedade, cada vez mais distante daquela era de ouro européia. Estabilidade econômica em decorrência de saúde financeira do Estado, enquanto condição necessária do crescimento econômico. Estado não legitima mais a socialdemocracia. No Brasil, mesmo ocorrendo ganhos de produtividade da indústria e parcela crescente do PIB se concentrando no setor de serviços, não entra nos trilhos do desenvolvimento da socialdemocracia padrão europeu. Milhões de chineses, coreanos e indianos continuam saindo da pobreza, com a diminuição de suas desigualdades, mas o Brasil vivência o contínuo aumento da pobreza e desigualdade de renda.
Redemocratização brasileira, padrão Constituição Federal de 1988 resultou na hiperfragmentação dos partidos, com a exclusão dos dois partidos que por 24 anos monopolizaram a competição pelo Executivo: fim do ciclo PT-PSDB no comando do governo federal, assegurando a estabilidade democrática na Terceira República. Com as manifestações de 2013, iniciou-se um movimento de maneira eficiente de investimento contra as instituições democráticas, cujo imaginário conservador, regressivo e reacionário, vem avançando na adulteração dos fatos históricos, convencendo alguns setores sociais de que não tivemos ditadura militar no Brasil, com objetivo explícito de reescrever a história política com mentiras sobre os 21 anos de ditadura.
Candidato de extrema direita conquistou a Presidência da República Federativa do Brasil, desalinhando, pela raiz, o sistema partidário, conforme Sérgio Abranches no livro: “Presidencialismo de Coalizão.” Legislativo gera crises políticas por causa da polarização instalada, incapaz de aprovar políticas públicas de qualidade, com crise econômica sem reformas necessárias, aumentando o desemprego, cujo sistema partidário vive em corrupção sistêmica. Brasil enfrenta tempestade perfeita: crise econômica, desigualdades crescentes, exclusão, desemprego, com empobrecimento da maioria da população. Presidência da República está comprometida com ideário político de extrema direita, cuja agenda de valores ultraconservadora tolera violência sectária dos seus fiéis seguidores contra os que se recusam a mimetizar os pensamentos e ações do presidente, contribuição institucional antidemocrática. Desde a Ação Integralista Brasileira (AIB), dissolvida pela ditadura do Estado Novo, não se via movimentos de ultradireita em processo de organização partidária, cuja âncora é o presidente Bolsonaro, dando identidade ideológica que vem se alastrando pela sociedade brasileira, elevando radicalismos, intolerâncias, aumento as desigualdades. É Brasil de sempre: raiz escravista, historicamente violento, autoritário e desigual em grau absurdo para a socialdemocracia européia. Democracia brasileira em perpétua debilidade, volatilidade e tortuoso desenvolvimento de seu capitalismo com democracia.
*Cientista Político