Amauri Paixão*

Decepcionados com os rumos das políticas do governo federal nos últimos vinte anos, grande parte do eleitorado do Brasil fez uma introversão[*], buscando conforto e abrigo nos tempos anteriormente a Constituição Federal de 1988, e na utopia do autoritarismo militar de 1964. Os ícones da TFP, tradição, família e propriedade, associação patrocinada pelo deputado federal Constituinte em 1934, escritor e jornalista católico, paulista Plinio Corrêa de Oliveira, pautada na tradição católica e no combate às ideias maçônicas, socialistas e comunistas, ressurgiram das cinzas, e vestidos de verde e amarelo converteram a prática política e a diversidade cultural numa onda moralista em que os arautos da conspiração internacional contra o Brasil saíram do armário e, em breve período de tempo, se instalaram nos altos cargos do governo bolsonaristas.
Longe de nós firmarmos composição com os exaltados militantes da esquerda e hermeneutas marxistas. Nossa leitura da conjuntura brasileira está inspirada no papa Bento XVI e o sociólogo Jurista Alf Ross (1899-1979), dinamarquês, conhecido nas fileiras jurídicas das melhores universidades brasileiras, exemplo USP e outras, como doutrinador empirista e discípulo de Ludwing Wittgestein, situados no âmbito do pensamento conservador do positivismo e empirismo lógico.
É com essa lente de vigilantes conservadores que se apresenta e aparece no campo religioso a irradiação da Igreja Tridentina do século XVI, neste começo do novo século, desvanecendo as fortes cores do Concilio Vaticano II, de 1965, e suprimindo os desdobramentos de um movimento cristão de grande amplitude, que buscou implantar uma igreja popular, laica, e adepta de politicas sociais de inclusão dos mais pobres e excluídos, conforme a definição dos seus ideólogos, por exemplo, Gustavo Gutierrez.
Percebe-se entre os mais jovens um retraimento buscando folego de sobrevivência nos modelos tradicionais de família. Muitos deles se negam ao “desfrute” sexual, pertinentes à uma moral permissiva, e prometem castidade até a consumação do sacramento matrimonial.
A tecnologia da terceira revolução industrial e o crescimento da quarta revolução estão abastecendo o mercado de consumo globalizado de máquinas e equipamentos que estão rapidamente transformando a comunicação digital, promovendo o homem comum, do povo, de longínquos lugares, aldeias, grotões, em editores cibernéticos, permitindo a elevação de sua voz singular – e seus costumes e moralidade local – a milhares de ouvintes e espectadores na internet.
A mídia nacional confere um moralismo procedente dos tribunais em que a subjetividade interpretativa de juízes de tribunais inferiores se transformou em paradigmas absolutos, padronizando as funções jurisdicionais do estado brasileiro, homogenizando as decisões judicias, inclusive nos tribunais superiores.
Nas igrejas contemplamos um moralismo episcopal que impõe um proselitismo de bispos locais, unificando doutrinas e religiosidades, às vezes contrárias aos ensinamentos da autoridade papal vigente.
Bento XVI enunciou em 2010 que CRISTIANISMO NÃO É MORALISMO. Somente o amor e a caridade presidem o coração do cristão.
Uma onda moralizante transpira pelas redes sociais. É um sinal de desencanto que ao longo da história já ocorreu no século XVI, no período das guerras mundiais 1917-1945; em 1970, nos EUA, com a expansão da politica fundamentalista cristã.
A sociedade brasileira está sitiada pelos cavaleiros moralistas. Eles impõem “bullying” aos seus desafetos nas redes sociais na efervescente internet.
Aos sacerdotes, líderes, políticos comunitários e municipalistas é preciso caridade-amor cristão, muita tolerância e disposição de abertura e acolhimento para recepcionar este povo cansado e oprimido por falta de esperança.
Como já tem mostrado fartos estudos históricos, estes momentos depressivos nacionais, passam, são superados. Cremos com a palavra missionária de Bento XVI, e o exame ponderado do sociólogo jurídico Alf Ross, a força da liberdade na essência da humanidade e a necessidade civilizatória da ordem e vivência democrática vencerão: e poderemos confirmar que cristianismo não é moralismo.

*Advogado e sacerdote católico