Cesar Vanucci *

“Uma corrida de revezamento.”
(Explicação didática de Barack Obama,
sobre a disputa eleitoral numa democracia)

Extrair da democracia, para plena utilização, todo ímpeto criativo, todas as propostas construtivas que ela seja capaz de engendrar. Confiar na democracia assim como “a palmeira confia no vento e o vento confia no ar”, conforme a recomendação poética de Thiago de Mello, mesmo sabendo-a carregada de imperfeições por culpa de equivocadas posturas humanas. Expressar inabalável convicção de que a pior das democracias é preferível à melhor das ditaduras. Ter presente, a propósito, que a expressão “melhor das ditaduras” não passa de mero ardil de linguagem.

Todo regime despótico, não importando a lateralidade ideológica, se de esquerda ou de direita, revela-se inapto a assegurar aos cidadãos subjugados qualquer vantagem compensatória em relação à aterrorizante supressão da liberdade. Relembrar sempre, sobretudo quando diante de alguma frustração política, aquela irretocável definição sobre a democracia feita pelo estadista Winston Churchill na Câmara dos Comuns inglesa, em 11 de setembro de 1947. Aqui está ela: “Ninguém pretende que a democracia seja perfeita ou sem defeito. Tem-se dito que a democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais formas que têm sido experimentadas de tempos em tempos.”

É preciso manter a atenção fixada nas engrenagens operacionais do sistema democrático. Absorver bem a ideia de que o voto significa voz. E que o vozerio majoritário outra coisa não exprime senão uma vontade a ser acatada sem tergiversações. Barack Obama, presidente do qual seus compatriotas sentem imensa saudade nesta fase de sucessivos desatinos praticados pelo sucessor, certa feita recorreu a sugestivo exemplo mode quê explicar didaticamente o mecanismo que rege o jogo democrático. Comparou as periódicas disputas eletivas a uma eletrizante corrida de revezamento. A cada etapa da competição o bastão é trocado de mãos. Os contendores dão o melhor de si, no percurso extenuante que se lhes toca cobrir, para levarem a cabo satisfatoriamente sua missão. Cuidam zelosamente, fieis a saudáveis regras, da respeitosa entrega do bastão aos disputantes seguintes. Ficam no direito, se assim desejarem, caso se ofereçam condições propícias, a participar das futuras corridas de revezamento.

A corrida eleitoral brasileira chegou ao seu epílogo. Foi pontuada, em não poucos instantes, por indesejável fragor belicoso, alimentado por exacerbadas paixões. Dos brasileiros de boa-vontade espera-se, agora, procurem com serenidade e inteligência, espírito desarmado, participar ativamente das etapas de construção do progresso e desenvolvimento que venham a ser programadas pelo interesse nacional e pela democracia. Com ideias propositivas, mesmo em situações que inspirem compreensível avaliação crítica, chutando pra fora da cancha desavenças de teor desedificante, cada cidadão é convocado a ocupar lugar no inadiável e ingente esforço de mobilização das forças vivas da nacionalidade em favor de políticas econômicas e administrativas capazes de assegurar crescente prosperidade para todos.

As siglas partidárias e as correntes de opinião são elos importantíssimos no encadeamento democrático. Acima delas, entretanto, importa muito colocar o sagrado interesse da coletividade. Coletividade essa que abriga infinitas diversidades de pensamento e métodos de ação. A liderança legitimamente obtida nas urnas pelos governantes recém-eleitos deles reclama grandeza cívica, sob a forma de gestos e palavras que apaziguem ânimos, eliminem desagradáveis idiossincrasias e traduzam sincera disposição em aceitar contribuições alheias de boas ideias na execução das politicas públicas a serem deflagradas objetivando a expansão do bem-estar comunitário. De outra parte, de quem se alinhe nas fileiras da oposição, portadores de uma missão relevante no esquema democrático republicano, é de se aguardar, pela mesma forma, demonstrações de isenção e capacidade para não se furtarem à cooperação noa projetos e iniciativas dos governantes que consultem realmente as aspirações da sociedade.

É assim que as coisas funcionam na democracia. Nalgumas horas, uma clareira carece ser aberta na penosa caminhada do país em busca de seu destino, para que todos, independentemente das tendências e simpatias políticas, conscientes de que um poder mais alto de alevanta, se entreguem a uma generosa troca de experiências e produtivo reforço de ideias e atos que permitam imprimir ritmo mais veloz na busca dos objetivos sociais e civilizatórios.

* Jornalista (cantonius1@yahoo.com.br)