Cesar Vanucci *

“A democracia é, antes de tudo, um estado de espírito.”
(Pierre Mendes-France, político francês)

O que, na realidade, anda acontecendo e pode até ser previsto, a esta altura do campeonato, quando as pessoas já cuidam de desentranhar o título eleitoral da pasta de documentos recolhida à gaveta do armário? Falar verdade, para começo de conversa, nem mesmo as criaturas de raciocínio mais lerdo alimentam ilusão quanto à possibilidade de escaparmos ilesos dessa baita encrenca gerada pelas tricas e futricas da politicagem.

O cenário mostra-se mais sensível a palpites do que a diagnósticos. A zorra criada pelos casuísmos de sempre torna temerária qualquer análise com pretensão de ser levada a sério. Esta abertura ampla, geral e irrestrita das comportas do fisiologismo mais descarado, patrocinada pelas incorrigíveis agremiações partidárias, eleva o tom da perplexidade nas ruas. Afigura-se difícil vislumbrar, com algum grau razoável de precisão, os reais posicionamentos e ideias dos candidatos, sobretudo aos postos majoritários.

Com o “desconfiômetro” focado nos esquemas empregados pelas legendas nas composições das alianças, os atônitos votantes encontram fartas razões para admitir algo que soa meio constrangedor. As semelhanças detectadas entre os concorrentes aos cargos em disputa são muito mais acentuadas do que, a princípio, seria próprio imaginar. Afinal de contas, a pugna eleitoral envolve um número elevado de legendas. As diferenças de comportamento, face a tal circunstância, deveriam ser marcantes. Dando voz ao seu inconformismo, parte das legiões que se mobilizam para ir às urnas não titubeia em sintetizar numa amarga sentença a impressão deixada pelas pregações, até aqui pelo menos, dos postulantes às funções de maior realce: farinha do mesmo saco…

Tudo quanto posto não é de molde, nada obstante, fique claro, para negar a importância fundamental da eleição que se avizinha em nosso processo evolutivo como Nação. A democracia, único regime político consentâneo com a dignidade humana, reconhece as eleições como eventos válidos para a corrigenda de desacertos eventualmente praticados pelos políticos. Já que, agora, o quadro dos contendores ao pleito de outubro se acha praticamente definido, a recomendação apropriada é tocar a bola pra frente. É compreensível, portanto, à vista disso, que o eleitorado se ponha na ardente expectativa de que os ungidos se compenetrem da necessidade de explicar melhor, com argumentos convincentes, a que vêm. A esclarecer nos devidos conformes a imensa plateia, ávida por informações, sobre suas propostas, seus projetos. Dar a conhecer suas percepções a respeito de um mundão de questões essenciais. A apontar, para um tantão de tormentosos problemas, soluções harmonizadas com as aspirações da sociedade.

O sagrado interesse coletivo espera que, nos debates, na divulgação dos programas, nas entrevistas, em toda e qualquer modalidade de manifestação endereçada aos eleitores, os candidatos digam sem rebuços, com persuasiva convicção, coisas até agora fugidias em seus contatos com as camadas populares. Interessa a todos saber as propostas que trazem na mente no sentido de promover a retomada do desenvolvimento econômico e social.

Um país com as prodigiosas potencialidades deste nosso Brasil não se conforma com o marasmo, com a impactante inação que vêm pontilhando, em tempos mais recentes, sua trajetória rica em perspectivas alvissareiras. Uma eleição no regime democrático acena com possibilidades de benfazejas transformações. Ser candidato a funções que enfeixem poderes em condições de definir rumos corretos nas mudanças sociais e econômicas almejadas exige uma sintonia fina com o genuíno sentimento nacional. Isso implica em indesviável compromisso com atitudes de defesa desassombrada de nossa soberania. Em posturas, obviamente éticas, que confiram prioridade aos objetivos sociais no esforço pela ampliação das áreas do bem-estar coletivo.

É mais do que justo, por conseguinte, aguardar-se, agora, no estreito tempo destinado à propaganda eleitoral, que os personagens escolhidos nas convenções partidárias se consagrem, com todo denodo que lhes seja possível, a expor, clara e inequivocamente, as ideias que os impulsionam a reivindicar a preferência e simpatia dos eleitores. Imprimir transparência solar à campanha pela conquista de votos representa contribuição digna de nota ao esforço que se deseja da classe política em procurar reverter, um pouco que seja, a frustração causada pelos desatinos cometidos por muitos de seus representantes.

* Jornalista (cantonius1@yahoo.com.br)