No decorrer deste ano, 59.700 mulheres devem ser diagnosticadas com novos casos de câncer de mama no Brasil, segundo estimativa do Instituto Nacional de Câncer (Inca). Dessas, em torno de 60% serão encaminhadas para radioterapia em alguma fase do tratamento e poderão desenvolver, entre outras reações adversas, um tipo de lesão na pele chamada radiodermatite. Mas estudos desenvolvidos na Universidade Federal de Uberlândia (UFU) indicam formas de diminuir esse problema. Até o horário em que as sessões de radioterapia são feitas pode fazer diferença.
Pesquisas sobre câncer de mama são desenvolvidas no Laboratório de Nanobiotecnologia da UFU. Na imagem, a biomédica Letícia Lopes Dantas, mestranda do Programa de Pós-Graduação em Genética e Bioquímica, demonstra como é feita a extração do RNA do sangue. (Foto: Milton Santos)
O estudo
A pesquisa foi desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da Faculdade de Medicina (Famed/UFU) pela enfermeira e então doutoranda Marceila de Andrade Fuzissaki, orientada pela professora Yara Cristina de Paiva Maia e coorientada pela oncologista Paula Philbert Lajolo Canto.
Entre 2016 e 2017, foram monitoradas, semanalmente, 100 mulheres com câncer de mama em tratamento no Hospital de Clínicas de Uberlândia (HCU/UFU) por radioterapia, ou seja, elas recebiam radiação ionizante para combater as células cancerígenas.
As sessões de radioterapia são feitas diariamente, durante cerca de 50 dias. A radiação é cumulativa e pode provocar na pele efeitos agudos – eritemas, descamação seca, descamação úmida e ulceração – e efeitos tardios – ulceração tardia, necrose, fibrose e telangiectasia (pequenos vasos sanguíneos na pele).
Fuzissaki observou as 100 pacientes antes, durante e depois do tratamento. A conclusão foi de que a pele escura, o tamanho maior da mama e a realização de sessões de radioterapia no período da tarde são fatores de risco para a ocorrência de radiodermatite mais severas nas mulheres avaliadas.
“A radiodermatite é uma lesão causada pela radiação. Para atingir o tumor, a radiação necessariamente passa pela pele. Aquele local onde vai ser irradiado, que se chama de campo, pode desenvolver essa lesão”, explica Fuzissaki. Segundo a enfermeira, há casos em que as radiodermatites ficam tão severas que é preciso interromper o tratamento.
A enfermeira Marceila de Andrade Fuzissaki (esquerda) foi orientada no doutorado pela professora Yara Cristina de Paiva Maia (direita). (Foto: Milton Santos)
Fatores de risco
De acordo com a tese de Fuzissaki, a maior incidência de radiodermatites severas em mulheres negras e pardas pode estar relacionada às alterações genéticas e moleculares que ocorrem em resposta à radiação no melanócito, que está relacionado à produção de melanina, responsável pela cor escura da pele.
As pesquisadoras também observaram que mulheres com mama grande apresentaram um maior risco de desenvolver radiodermatites, o que pode ser justificado pela maior quantidade de tecido adiposo que, quando irradiado, secreta substâncias que produzem uma resposta inflamatória acentuada. Além disso, a mama grande recebe doses maiores de radiação para que o local do tumor seja efetivamente tratado.
“Em relação à cronoterapia, estudos indicam que a ação do tratamento pode variar de acordo com o período do dia em que as pacientes são tratadas”, explica Fuzissaki. A cronoterapia considera a influência do ritmo circadiano – o relógio biológico que regula o metabolismo das nossas células ao longo do dia e pode explicar o fato de mulheres submetidas à radioterapia no período da tarde ter apresentado maior risco de radiodermatites
A enfermeira, que defendeu sua tese de doutorado em junho deste ano, também avaliou a qualidade de vida das pacientes por meio de questionário dermatológico específico aplicado em oito momentos diferentes – antes, durante e depois do tratamento. As pacientes que apresentaram radiodermatite severa tiveram uma pior qualidade de vida, por conta da dor, queimação e desconforto no local.
As pesquisadoras já tinham levantado essa hipótese, mas faltavam estudos que a comprovassem. A partir dos resultados da tese, é possível a adoção de ações que tornem o momento da radioterapia menos traumático para as pacientes.