Gustavo Hoffay*

Periodicamente deparo-me com placas ou luminosos afixados sobre a porta de algum salão ou galpão e onde, em letras garrafais, realça-se o nome de algo que passa-se por igreja ou “pronto-socorro espiritual”. Isso, creio, é uma percepção geral e torna claro o interesse que há por trás de cada uma das portas daqueles locais e sempre vigiadas por pessoas que procuram esmerar-se em mesuras. Uma multiplicação de seitas que, sabe-se também, desorienta e divide cristãos. São tantos os meios usados por algumas delas no sentido de angariar o maior número possível de crentes (ou clientes?) que, sinceramente, deve causar em alguns dos seus próprios adeptos uma certa desconfiança em seus procedimentos. Uma nova classe religiosa que parece destilar maldições contra os inimigos da fé, os hereges e idólatras e que faz lembrar a muitos antigas práticas de aiatolás. E não é apenas em nosso “patropi” que aquelas instituições avançam parecendo implantar esperança aos gritos e colhendo adeptos às pencas. Na Europa e nos Estados Unidos as tais seitas, ao menos por enquanto, ainda proliferam sob concepções filosóficas ou humanistas. Leem a Bíblia, claro, mas sempre adaptam as sagradas escrituras àquilo que mais interessa-lhes em determinado momento, conquistando dessa forma a simpatia de grande parte de populares humildes e, quanto mais, quando dão respostas a toda e qualquer ansiedade daqueles que acorrem em profusão a milhares de seus templos encravados em regiões e cidades estrategicamente localizadas e, ainda, utilizando-se de técnicas de manipulação social e psicológica. De unha encravada à falta de dinheiro, conseguir casamento ou acertar sozinho na Mega Sena, são várias as causas que levam milhares de brasileiros a adentrar galpões por ai a fora e a gritarem por Deus, num claro sinal de que estamos presenciando uma autêntica e (talvez) perigosa mutação no comportamento social e principalmente a partir de classes menos instruídas e ainda menos favorecidas, tanto em meios urbanos quanto em zonas rurais. Evidentemente nada tenho contra a fé das pessoas que assim procedem mas, sim, contra a exploração da qual elas são vítimas. Em busca de um alivio para o espírito dos seus frequentadores, as ditas “seitas” oferecem recepcionistas atenciosos, acolhedores, fraternos e cheios de calor humano, enquanto os seus pastores intervêm em favor dos seus fiéis por meios ditos sobrenaturais. Seus representantes, atuantes até mesmo dentro de ônibus urbanos diversos e enquanto trazendo às mãos uma Bíblia aberta, apelam a orações e oferecem “direção espiritual” aos aflitos. Aproveitando que o Brasil é uma república onde a liberdade religiosa é garantida pela Constituição e a abertura de templos é facilitada pela isenção de determinados impostos e taxas, novas “igrejas” são abertas a cada dia e atuam por meio de um marketing ainda mais agressivo, em virtude da grande carência de soluções governamentais para muitos dos problemas nacionais e principalmente aqueles relacionados à economia e a questões de cunho social e político. Sim, aproveitando-se da vulnerabilidade de muitos brasileiros e originada da latente humildade de cada um, aqueles locais parecem manipular os seus frequentadores e a ponto de despertarem neles um fanatismo religioso que, ao meu ver, chega mesmo a suscitar algumas práticas que apelam para a irracionalidade e o total desrespeito à inteligência humana. Até o início da década de noventa, confesso, eu imaginava que o surto de seitas seria algo passageiro; sim ,um surto e nada mais. Ledo engano! Aproveitando-se de carências diversas de considerável parte da nossa população, pessoas que coordenam aqueles grupos passaram-me a impressão de explorar quem tivesse fome, alguma doença crônica, necessidade de asilo político, procurassem por emprego ou mesmo sentissem falta de sentido da vida. E é evidente que essas situações geram um terrível sentimento de abandono a muitas pessoas e agravado pelo fato de pais separados ou sentimentos de baixa autoestima, por exemplo. Um quadro, portanto, desanimador mas que encontra naquelas igrejas palavras de “salvação ou mãos amigas estendidas” e cujos pastores prometem desvendar o futuro, enquanto profetizando em nome de Deus e com o intuito único de obter benefícios de seus fiéis. Emoção sob medida para problemas diversos e situações complicadas, “tudo em um só lugar” e com direito a aparecer na televisão, enquanto algum guru ou mestre realiza “ verdadeiros e maravilhosos milagres” que conseguem, muitas vezes, superar a razão de muitos dos fiéis cansados e desanimados da vida. Desanimar, jamais, pois em breve a humanidade será renovada e o mundo será naturalmente melhor, basta que se tenha fé diante de excitações fanáticas, cegas e doentias, provocada e alimentada por meios ambíguos e rituais e sermões que chegam à raia da morbidez. No Brasil a prática de tudo isso ainda é permitida, mas na Europa alguns governos já alertam para tal estado de coisas; aumentam os processos perante tribunais civis contra o procedimento de determinados grupos religiosos e um Código de Conduta Comunitário já há tempos é adotado naquele continente, visando coibir o modo de se portar e agir de algumas seitas, baseado no fato de que tal estado de coisas é muito perigoso tanto para os indivíduos quanto para a sociedade.

*Agente Social