Cesar Vanucci *

“Basta um maluco para apertar o botão. Temos dois.”
(Nick Cohem, no “The Observer”)

O Iêmen está localizado nos confins do mundo, num lugar em que Judas perdeu as botas. Açoitado por guerra civil que já dura três anos, alvo de uma intervenção militar estrangeira capitaneada pela Arábia Saudita, vê-se agora as voltas com apavorante crise humanitária provocada pela disseminação do cólera. Segundo denúncia da organização “Médicos Sem Fronteiras”, ganhadora recentemente de um “Nobel da Paz”, 9 mil pessoas estão sendo alvejadas a cada dia pelo insidioso mal. Os recursos canalizados pela comunidade internacional para socorro da população, calculada em 10 milhões, ou são considerados insuficientes para prover as necessidades, ou deixam de chegar aos postos de atendimento por causa dos conflitos em andamento. As consequências funestas de tudo isso estão traduzidas nas milhares de covas abertas, todos os dias, para acolher as inocentes vítimas do flagelo. Não se sabe até aqui de nenhum comunicado emitido por qualquer organização terrorista, conhecida ou por conhecer, assumindo responsabilidade por esse atentado hediondo contra a dignidade humana.

Em “The Observer”, o jornalista Nick Cohem assinala: “Basta um maluco para apertar o botão. Nós temos dois.” Não pode ser descartada assim, sem mais nem menos, confundida como mero ato paranoico, a partir dessa constatação, eventual previsão apocalíptica que venha a brotar das cumulativas aprontações procedidas pelos dois cidadãos supra apontados, os mais “graduados” de um apreciável contingente de malucos. O coreano Kim Jong-un e o americano Donald Trump, com suas reiteradas e arriscadas bravatices e (só de pensar, dá um calafrio gélido na espinha de qualquer mortal) seu acesso desembaraçado aos botões dos códigos nucleares, especializaram-se em espalhar sobressalto e apreensão à mancheia. A cada fala raivosa trazida a publico, vou te contar… Ambos andam flertando perigosamente a possibilidade de uma escaramuça bélica pra valer. Um conflito capaz de conduzir este maltratado planeta a uma inimaginável tragédia. Talvez definitiva.

Explique aí quem puder. O sinistro “Califado do terror”, baseado em áreas sírias, iraquianas e líbias com ramificações noutros países do Levante e da África, está sitiado por terra, mar e ar por forças militares poderosas, que têm ao dispor equipamentos bélicos sofisticadíssimos. Mas não dá provas de esmorecimento no propósito de espalhar o pavor e a selvageria. Essas circunstâncias todas somadas atordoam experimentados observadores. Difícil pacas entender essa tremenda confusão das arábias. Como interpretar o fato de não surgirem sinais de enfraquecimento na capacidade guerreira dessas coléricas falanges que deturpam a mensagem filosófica islâmica para “justificar” tenebrosas investidas contra a dignidade da vida? Afinal de contas, quem financia esses doidos ensandecidos? Como fazem eles para renovar seus arsenais? Por que meios chegam ás suas mãos os equipamentos utilizados nas batalhas? Fica claro que se trata de material bélico produzido por uma indústria armamentista de alta tecnologia, a qual, evidentemente, não mantém complexos produtivos nas regiões sob o controle do Califado. Partindo da alucinada suposição de que os terroristas adquiram o material essencial a sua tresloucada aventura militar longe de seus domínios, como é que as encomendas chegam até eles? De onde sai a “nota preta” para a quitação das compras? Mais: de qual sistema bancário se valem os dirigentes do EI para fazer as operações financeiras que lhes permitam honrar os compromissos contraídos com os vendedores? Tem mais: de onde chega o combustível para acionar os tanques, carros de combate e outros veículos? Escuta aqui, não vale responder que o combustível estaria sendo obtido em refinarias que possam, eventualmente, continuar operando nas regiões ocupadas. Na hipótese de que a presumível fonte de suprimento de óleo esteja em tais refinarias, ainda restaria, à espera de resposta, implacável pergunta: o que impediria aviões, porta-aviões, drones dos exércitos sitiantes de paralisarem para valer as atividades dessas unidades processadoras de combustível? Hein? Não tem como fugir. Há coisas por demais obscuras e inextricáveis sobrepairando no ar nessa história da guerra promovida pelo e contra o terrorismo.

* Jornalista (cantonius1@yahoo.com.br)